quarta-feira, abril 30, 2008

Bailarina

 
A caneta bamboleava entre os dedos quando decidiu subir em uma árvore...
Sairia no final do expediente e encontraria uma árvore convidativa no meio de algum canteiro solitário e a escalaria, tal qual nos tempos de criança. (Mesmo sem lembrar de haver feito isso nesse tempo, e tão pouco tem alguma reminiscência concreta de haver sido criança. Crê que nasceu de calças de pregas e sapato social...).
Talvez nunca houvesse realizado tal feito realmente, mas guardava algum tipo de sensação saudosista imaginária de um feito heróico e desafiador de limites, ao chegar ao topo de uma enorme árvore de um jardim igualmente imaginário, enquanto uma platéia invejosa espiava com o olhar esticado para lhe alcançar. E era só isso que queria: não ser alcançado.
Pensou o quanto soaria ridículo ao confessar a alguém uma decisão que parecia tão inadequada de dentro do seu nó duplo de gravata. Subir uma árvore, sem razão aparente, racional e dedutível no imposto de renda... Isso o torna tão sonhador quanto àqueles a quem devora no café da manhã todos os dias.
Tinha medo.
Porque nunca poderia desabotoar a camisa italiana, livrar-se do terno inglês e abandonar-se a um mundo sem pátria em um galho de figueira florida... E lá do alto, poderia dizer sem que ninguém ouvisse. Desse topo poderia confessar sem testemunhas a falta que lhe faz apenas não ser. 
Quer dançar a sua dança, levado por aqueles galhos, que poderiam ser seus braços, colando o corpo aquele tronco e abandonar-se por se saber achado. O colarinho não aprisiona palavras doces, nem tão pouco o esconde das paixões e desse arrebatamento que o persegue sem cessar.
Árvore bailarina, gingando no ritmo da brisa.

Um comentário:

Anônimo disse...

A poet in the making !