sexta-feira, janeiro 18, 2013

O Palco

O texto rondava fazia um tempinho, mas agora ai está! 
Creio que vai demorar um tantinho para uma próxima postagem por dois lindos motivos superiores que estão para chegar, mas hora ou outra estarei por aqui novamente...





De alguns fatos não há como se esconder, por mais vergonhosos que sejam. Eu sempre quis saber cantar. Sem muitas justificativas, ou longos discursos sobre expressão artística ou da alma. O máximo que consegui foi a conveniência de uma mudez infame.



Para aumentar a humilhação, com o tempo, adquiri técnicas para ocultar-me no acanhamento e apropriava-me da voz alheia aprisionando-a na minha boca vazia enquanto a melodia ajudava o embuste mudo do meu canto inexistente. Dublagem de voz e sentimentos. Nada mais apropriado!



Acho que por isso odeio tanto você, despindo-me da minha farsa perfeita, me fez imaginar palcos, e até imaginei cantar no seu ouvido enquanto você ouvia e sorria. Imaginei que gostaria de ver-me envolta em compassos, que amaria tudo o que escorreria dos meus refrãos, não como verdades ou juras, mas como a imagem das possibilidades que nunca realizaríamos. Como eu o odeio!



Não sei se para me afrontar, você sim cantava e eu gostava de ouvir. E eu ficava intrigada tentando encontrar explicação para perfeição. Os sons não saiam apenas dos lábios, mas também daqueles olhos disfarçados de boca que confessavam, mas nunca me diziam. Você cantava e eu emudecia.  Como parte da crueldade, amava vê-lo cantar, me tornando a mais miserável das criaturas.



E eu, apenas me afogava em palavras que nunca ganhariam pernas enquanto ele todo prazeres! Boca, peito, palavras e juras! Gostaria de escrever as rimas de uma paixão certa e concreta, cheias de detalhes e toques, cheios desse você que tanto detesto!



E muda deveria ter me mantido. Mas ao invés de me recolher no canto escuro da minha raiva de vê-lo desenhando em acordes, agarro-me ao microfone na certeza de que terei a voz e cantarei. 



Mesmo assim, só me resta o silêncio!

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Já não se escrevem mais cartas como antes. Tão pouco canções que brotem da caneta imaginária de um poeta sofrido.  Mas ela guarda letras embaixo do colchão. Esconde cartas amarrotadas que nunca serão enviadas. Criatura de outro tempo esta! Não pertence ao passado e assombra o presente. E se assim pode ser dito, só se constrói inteira em um futuro que imagina em diversos finais, montados e remontados, se deliciando com as possibilidades.



O calor dos holofotes faziam suar a testa. Minúsculas gotículas brotando pela pele. Disfarçadamente limpava o suor com as costas da mão direita enquanto sorria angustiada, procurando a primeira saída, a fuga perfeita. Mas encurralada que estava em seu próprio orgulho, balançava-se sobre os próprios pés, dentro de seus saltos vermelhos de camurça. 



Vestia-se de sua personagem indefectível de si mesma e agarrava o microfone, se deixando penetrar pela dor de um sentimento anunciado pelo primeiro acorde que ressoava. Quem assistia este segundo entre aqueles olhos fechados e a primeira nota, prendia a respiração em suspense exultante, em espera atenta, quase em um estado de paixão. 



E só assim, devorado, as mãos inquietas, torcendo os dedos em infindável anseio pelo segundo seguinte, tirano e consumista insaciável,  porque o presente nunca basta em si. Odiava a ousadia desafiadora, entregue a própria voz.



Embalada em notas e sonhos de outro tempo, cobre-me com poesia e desejos. Fecha os olhos enquanto canta, mas se sente incapaz de o fazer enquanto beija. Engulo o ódio que me dedica, e o amor que me recusa, junto com as palavras e notas.

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