quinta-feira, dezembro 21, 2006

Janelas


Em uma tediosa e monocórdica aula anos atrás disse o professor de biologia, sem qualquer expectativa de que as cabecinhas viajantes de seus alunos fossem gravar qualquer daquelas informações, que:

“As borboletas e as mariposas são insetos da ordem Lepidóptera. Na Europa, porém, mariposa é um sinónimo de borboleta, mas no Brasil é a designação comum dos insectos lepidópteros noturnos ou crepusculares, insetos que lá são mais comumente conhecidos como traça”.

Essas palavras adormecidas na memória inócua de estudante relapsa voltaram debatendo-se ao escutar o som oco das batidas insistentes na lâmpada da sala. Passos sonolentos me tiram do quarto em direção ao som obstinado da tentativa daquela mariposa de fundir-se com a luz.

Parei logo abaixo da lâmpada esfregando os olhos tentando espantar as sombras de sono enquanto via as inúmeras voltas que dava, novos mergulhos suicidas, som oco, e voltas e voltas, e mergulhos. Acho que cheguei a sentir dor. Acho que pena. Ou talvez raiva...

Vilã marrom noturna, borboleta sem vontade se ser, sem o volitar suave e etéreo da prima rica... Abri a janela sentindo o frio da noite a me esfaquear, pensando que assim daria a chance de que ela fosse ao encontro a um destino menos doloroso do que um fatigado fim sem começo. Nada. Continuei observando sua vontade obstinada de se fundir à luz com a beleza das tentativas estéreis. Lembrei de você meu bem... E do quanto me faz crer na sua essencialidade, e do quanto assisto seus mergulhos e a beleza da sua tristeza insistente.

E se te abro uma janela?
(Créditos da ilustração: http://biagiosa.deviantart.com/)

terça-feira, dezembro 12, 2006


Assisti um filme uma vez, e a minha memória de jovem gagá certamente não irá me permitir lembrar do título, onde havia uma guerra intergaláctica entre diversos povos do universo, todos em busca da resposta para explicar a vida. Depois de muita batalha e muita gente morta (isso lembra alguma coisa???) eles finalmente chegam até um supercomputador que lhes disse com toda a autoridade que a resposta que eles buscavam era cinco. Bastava agora que encontrassem a pergunta correta, e só assim que eles entenderiam o sentido da vida... Resultado é que nunca se encontrou a pergunta... Sugestões??? (rsss) Não se matem façam o favor!

terça-feira, novembro 28, 2006

Viagem ao Mundo em 8 Segundos


Eu odeio os Egípcios. É fato.

E não dou a mínima para quem estiver se estrebuchado na cadeira achando minha afirmação um absurdo! Quero mais é que a civilização toda vá para... Não bastaram às notas baixas no colégio? Não... Eles têm que vir me assombrar o resto da vida? Meus motivos são simples e justos e tenho certeza que ninguém vai me olhar torto... Tinham que inventar os primórdios da cera quente ao misturar sândalo, argila e mel de abelha? Viu só? Civilização maléfica!

Mas mesmo odiando os Egípcios resolvi encarar todo o medo (provavelmente gerado pelas caras retorcidas das minhas amigas ao falarem do assunto...) e fui.

Assim, peito aberto.

Achando que essa era mais uma das lendas urbanas femininas do tipo “pentear o cabelo de cabeça para baixo cresce mais” ou “tamanho não é documento”, e “compre a calça jeans um número menor que depois cede”...

A placa era bastante elucidativa. “TEMOS DEPILAÇÃO COM CERA QUENTE”. Na foto umas pernas lindíssimas, torneadas e lisinhas, lisinhas. Pronto, quem não quer essa maravilha da evolução humana? Tá, tudo bem que não eram exatamente as pernas que eu queria depilar, mas não pode ser tão ruim, né?

Na sala de espera várias revistas sorridentes do mês passado discutindo as relações alheias, babando pela solteirice de Gianecchini (!), e um som ambiente agradabilíssimo. Tudo de propósito para desviar as atenções dos grunidos que vinham de dentro da famigerada sala...

As mulheres ao meu lado na sala de espera todas muito seguras de si, folheando sonoramente as pilhas de revistas, já as que saiam da portinha branquinha e inocente (uma inclusive com as pernas meio abertas e cara de dor...) me faziam começar a desconfiar que quebrar minha “virgindade de cera quente” havia sido uma má idéia.

Só faltava mais uma pessoa na minha frente e depois já era a minha vez. Hoje, e principalmente naquele dia, quis ser uma pessoa mais prática, decidida... Quis conseguir simplesmente pensar: “Vou embora” e levantar ao invés de viajar em elucubrações e terminar o pensamento lá no Taiti, que era exatamente onde estava minha cabeça quando a atendente disse: “Senhora? Sua vez...” Tremi. Vou negar não! Mas só na hora que a mulher de 1,80 e cara de “Helga – A enfermeira Húngara” apareceu toda vestida de branco estalando dos dedos das mãos dizendo: “Vem!”.

Fechou a porta de chave atrás de mim e riu. Isso é mau sinal. Qualquer pessoa mais prudente teria dado as costas e ido embora nesse momento. Mas não, veja só... Alguém ai aposta no que eu estava pensando??? No filme do Schwarzenegger. Nisso “Helga” me manda tirar a roupa... Assim, sem preliminares, sem beijinho no pescoço nem nada! (brincadeirinha gente!). E eu que devia ter fumado um maço de coentros obedeci! Ai pronto! A desgraça estava feita...

“Cantinho e axilas é ‘bem’ ?!”

Lá estava eu deitada na maca pensando que as Gregas em 2000 a.C arrancavam, os pêlos com as próprias mãos ou optavam por queimá-los com cinzas quentes sobre a pele, mas como a dor era muita (precisava nem dizer!), enchiam a cara antes para servir de anestesia. Cadê meu Whisky, pô?

Vamos começar por onde?” Perguntei simpática, (mas com a voz tremida, como não???) e “Helga” meigamente disse: “Por onde dói mais ‘bem’, porque depois que eu der a primeira ‘puxada’ daí você não corre mais, porque pior não fica!”. Ninguém pode negar que a mulher tem muita psicologia, não é?

Não obstante, ela manda que eu levante a perna o mais alto que puder... Ou seja... Não vou nem descrever que os pontos visualizados por ‘Helga’, provavelmente, nem meu doce e amado (hoje eu digo! ) ginecologista jamais viu! Ô situação esdrúxula!

Helga’ vem em minha direção com o papelzinho na mão e grudou a cera com firmeza, enquanto eu tento fechar os olhos (De olhos fechados dói menos?).
Bem que eu podia ter batido o carro antes de chegar aqui, ou aparecido um imprevisto inadiável, lindo e maravilhoso... Bem o que o Rick Martin podia aparecer na porta e ‘Helga’ iria correr para os seus braços... Ou a musiquinha do Plantão do Jornal da Globo tocar e quando ela virasse perguntando “ Ai meu Deus! quem morreu?”Eu saltaria da maca em um Duplo Twist Carpado e fugiria dali. Ou bem que... E foi nessa hora que vi as Muralhas da China, e que passei pela Ilhas Fiji, a Torre Eiffel, os canais de Veneza, e que vi os corais submersos dos mares do Pacífico, além de ver as malditas Pirâmides do Egito (que no final são até simpáticas!).

E voltei ao meu corpo dolorido e arrependido, enquanto ‘Helga’ satisfeita exibia o papelzinho arrancado, juntamente com meus pêlos, minha dignidade e um restinho do juízo que me sobrava, e tal qual o Sansão da Dalila, provavelmente iria se esvair até o final daquela minha apresentação as ‘maravilhas’ da cera quente.

Pois é, eu odeio os Egípcios...

terça-feira, novembro 21, 2006

Agora, Sim!


Já casei e batizei (Não necessariamente nessa ordem...)

Viajei... Linda fotos, e pouco tempo para escrever (esperado, não é?).
Mas não estou esquecida nem do Brincos, nem das amigas... Assim que a inspiração for maior que a pilha de papéis aqui da minha mesa, estarei postando algo mais adequado aos propósitos deste Blog.
Ademais, reitero o convite de que minhas amigas voltem a esta casa que tanto as adora! Escrevam meninas!

Beijos!

quinta-feira, outubro 26, 2006

Vi Minha Vida passar Diante dos Meus Olhos na Cadeira da Cabeleireira...

Já ouvi muitos relatos de pessoas que experimentam momentos de intensa reflexão (e não sei por que diabos a maioria só faz isso quando está prestes a morrer, ai não tem mais jeito, né meu velho???).

Ontem, após um longo dia de trabalho, lá fui arrumar os cabelos no salão, já que no dia seguinte pela manhã eu iria finalmente casar civilmente.

Sentada escutando um o ronco do secador, lembrei da minha vida inteira até aqui. A minha vida passou diante dos meus olhos na cadeira da cabeleireira...

Lembrei da minha primeira boneca, da primeira queda de bicicleta (alisar o joelho anteriormente ralado é instintivo!), das noites que acordava meu irmão com medo de baratas virtuais... rsss... Tadinho!
Dos meus pais me levando para escola, de brincar no balanço, do meu medo de altura, do meu corte no dedo cortando limão, de todos os natais...
Lembrei de todos os amigos, das pessoas que me compreenderam e das que não me compreenderam...
Lembrei ainda dele... Muito.
E de todo nosso caminho até aqui. Lembrei do quanto cresci ao seu lado, de quanto fiquei triste de vê-lo entrar naquela porta no aeroporto e de como me prometi nunca mais deixar isso acontecer...
Bateu um saudosismo esquisito de tudo que passou e uma saudade desse futuro que está prestes à começar... Mas acho que só posso chamar de FELICIDADE esse meu sorriso estampado na cara enquanto vejo minha vida passar diante dos olhos e pensar na quantidade enorme de momentos que ainda vou colecionar ao seu lado dele de agora em diante.
Essa quase ‘ode’ ao amor no calor morno do secador de cabelos. Meu jeito de dizer meu amor...
Meu jeito...

quarta-feira, outubro 11, 2006

Ladrão sim! Frouxo não!


"Quase todos os homens são capazes de suportar adversidades, mas se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder" (Abraham Lincoln)
Eu sei que eu tinha prometido não falar mais do Lula... Mas o cara não deixa! E tal qual o Bira da novela páginas da vida “É mais forte do que eu!”.

Rui as unhas... Posso fazer o quê? Depois de uma apuração dramática nas eleições presidenciais, ufa! Vamos ao segundo turno. Até pensei em alguns foguetões ou algo assim, não necessariamente para comemorar a vitória de partido A ou B, mas a vitória de um tantinho de bom senso...

Quer dizer, será??? Será que o bom senso tem haver com o resultado nas urnas? Gostaria muitíssimo de imaginar que cada eleitor parou sua vidinha para se deter em uma análise criteriosa sobre a inabilidade do governo atual de promover desenvolvimento ou por que não consegue manter a economia se não for à custa de impostos exorbitantes, a imagem internacional, os índices educacionais, o superavit primário e coisa e tal...

Mas no fim eu sei (infelizmente) que o Lula não levou, nem com Bolsa Miséria e tudo, porque “não tem aquilo roxo”... Que o diga o Collor e sua redenção política em Alagoas ao ser eleito o novo senador, que por ironia (ou não) do destino vai ocupar justamente a antiga vaga da Heloísa Helena (e nem precisou usar a mesma blusa um mês inteiro e dizer que vai “esmagar as elites”!).

A recusa em participar do debate promovido pela Rede Globo pelo candidato do PT (que já se considerava eleito) gerou um efeito contrário ao que se pretendia. Não ir para não ser achincalhado converteu-se em uma ausência muito mais prejudicial à imagem do nobre “companheiro”.
Nas ruas só o que se escutava no dia seguinte eram xingamentos que ultrapassavam a barreira do “tolerável”... Afinal, todo mundo fala mal da mãe do juiz e chama político de ladrão, mas rotular de “covarde”... Foi pesado! Disso só se pode concluir uma coisa: Para brasileiro “subtrair” indevidamente do erário público não é condenável, mas acovardar-se sim. Traduzindo: Ladrão tudo bem, mas frouxo não!!!
O poder é como violino. Toma-se com a esquerda e toca-se com a direita.” (Rsss... Adorei!)
(Esperidião Amim).

terça-feira, outubro 03, 2006

Always Madeleine

Madeleine Peyroux
I've seen love go by my door
It's never been this close before
Never been so easy or so slow
Been shooting in the dark too long
When something's not right it's wrong
You're gonna make me lonesome when you go
(...)

quinta-feira, setembro 21, 2006

Um Céu de Adeus


Disse-lhe que iria embora. Palavras que ele não poderia fazê-la engolir... Um “ir” que não poderia mais voltar... Irônico para não dizer trágico, foi o que pensou enquanto catava um restinho de voz no fundo da garganta para lhe dizer que estava muito feliz, que acreditava que isso era o melhor para ela. De fato talvez fosse se ele não estivesse perdendo com aquele “ir” todo o sentido de ser, estar e ficar.

Ainda segurava o telefone colado ao ouvido, mas cada palavra dela parecia-lhe se afastar mais uma quilômetro de distância... Uma voz rouca arranhava em um blues doído ao fundo enquanto ela dizia-lhe ao telefone que tinha algo para dar antes que fosse... Don’t you know that I need you... Don’t you know that I need you... Ainda girava o blues e a dor... Algo especial e que antes de lhe dar teria que ensiná-lo a usar... Algo que o manteria “muito, muito próximo” dela. Ele queria acreditar e queria pedir-lhe para largar aquela faca com a qual cortava sua pele, tão fina, ela não lembra? Queria parar de sentir que sem aviso roubaram-lhe a gravidade.

Se ao menos sentisse que ela sofria, mas nem condoída nem pensativa, muito mais próxima do eufórico do que ele das lambidas das chamas do inferno... No máximo conseguiu embebedar-se de mais auto-piedade. Imaginava amores novos, abraços novos, risos que não seriam dedicados a ele. Mais um pouco de chama. Foi ai que as cordas ela desatou. Foi bem nesse instante que viu crescer uma gigantesca parede de vidro entre os dois.

Disse-lhe que iria vê-la quanto antes! Disse-lhe mais outro tanto de inverdades agradáveis. Desligou. Agarrou-se a garrafa de vinho que ela lhe trouxe daquela viagem ao Chile. “Para beber em ocasiões especiais”. Dormiu sentindo a ilusão dos ébrios. Vinho adoçado com esperanças irreais. Os bons vinhos do Chile...

Às seis da tarde estava na frente do seu prédio. Às seis e dez dentro do elevador. Às seis horas, dez minutos e trinta e cinco segundos ela lhe abriu a porta sorrindo, lhe abraçando o corpo forte com seus braços frágeis e colando aquele corpo miúdo ao dele. Tinha pedido emprestado um sorriso de uns cartazes de anúncio na rua e colado em seu rosto. E isso a fazia tão bem, “não é meu bem?”.

Muitas caixas pelos cantos. Quadros fora da parede. Onde estão suas fotos e aquele sorriso torto ao seu lado no carnaval de 87? Um desalinho de fuga premeditada. Comentários rasos, infames, contraditórios, desnecessários e sem critério. Especialidade da casa. Era a única coisa que ele tinha a oferecer, pois estava oco. Completamente... Enquanto ela lhe cobria de detalhes da nova cidade e gesticulava alto quando falava desse bicho estranho de quatro patas, presas enormes e fome insaciável. Aquele bafo quente no pescoço. Futuro.

As palavras lhe vinham à boca como uma ânsia de vômito. Mas respira e tenta agir banalmente enquanto mergulha em um poço profundo de elucubrações. Finalmente ela lhe agarra a mão fazendo mil promessas de que nunca vai deixar de sentir saudades, e pedindo infantilmente que ele vá visitá-la nas próximas férias. Talvez mal saiba ela que as promessas são o primeiro passo para o esquecimento...

Sem soltar a mão que agora lhe encosta o peito leva-o até a varanda. Diz-lhe que não teve tempo de por um grande laço vermelho na sua luneta, mas que ele poderia imaginá-lo. Seu presente. Ela queria lhe dar estrelas.

Enquanto ela olha para o céu, debruçada sobre aquele “olho de vidro”, ele segue as linhas do piso com a ponta dos pés e o olhar perdido no chão. Tenta achar tantos porquês quantas são as toneladas do peso que arrasta desde que ela lhe disse esse “ir” infame... Porque nunca lhe disse que tanto desejava sua boca vermelha? E porque nunca lhe tocou os cabelos caídos sobre os ombros, porque nunca a pôs no colo e lhe olhou dentro dos olhos? Talvez tenha imaginado que teriam tempo infinito para saborear cada pedaço daquela eterna queda de braços... “Vamos brincar de gato-e-gato meu bem, vamos?” Mas entre eles não há como medir forças. Da igualdade só se retira derrota mútua... Ela cansou? Quem sabe ...

E como se montasse um enorme quebra-cabeça pensa no encontro. Pensa nesses “se” escondidos na esquina. Ela lhe fala das constelações e ele só pensa em seu próprio umbigo, na sua dor. Ela lhe conta a história mitológica de Órion e sorri apontando as Três Marias. Cão maior, cão menor e uma nebulosa. Pede-lhe que teste o equipamento, afinal agora aquela luneta é dele. Posiciona-o e lhe fecha o olho direito com o indicador rindo do seu mau jeito... E por aquela lente vê o que seria uma vida paralela ao lado dela, imagina até flores que logo murcham porque sabe que no máximo tiraria dela meia dúzia de boas risadas, um caminhão de tesão, e várias toneladas de desprezo raivoso no final. Não era o que queria. Abriu os olhos e cedeu de volta o espaço que a ela pertence...

Forças iguais devem se equilibrar... E o equilíbrio é seu sorriso pleno... Disso ele sabia. Ao mesmo tempo em que igualmente tinha consciência de que aquele sorriso dela era seu descompasso... Nem feliz nem triste. Nem presente nem ausente. Não sabia o que lhe doía mais...

“Buracos negros convivem?” Perguntou-lhe de surpresa. E ela ria divertida pelas curiosidades infantis enquanto explicava sobre a força gravitacional e velocidade da luz. Por mais que ele soubesse que ela não é estrela. Tão pouco ele. “Somos buracos negros meu bem, somos buracos negros!”.

A simplicidade é a meta, tal qual uma poesia perfeita, ela lhe explicava. Redonda e vazia, era o que pensava... Talvez por isso que ela nunca conseguiu enfiar ele em versos. Juntar seus pedaços como se costurasse grãos de areia com agulha e linha.

Ela pede uma estrela daquelas muitas apontando com o dedo e diz que é dela. Ela pede um até logo e ele só tem a lhe dar um monte de acenos teatrais típicos das partidas. Saiu daquela porta carregando, ela, uma estrela, uma luneta e um adeus.


P.:S.: Para ser lido ao som de Água - Jarabe de Palo

quarta-feira, setembro 20, 2006

Operação Buraco Negro


Estou chegando à conclusão que as pessoas ‘babam’ por uma polêmica, por um ‘disse-me-disse’, e escândalo então! Ô! Melhor do que novela das oito!

Acho que foi por isso que dia desses escutei alguém dizendo que bastou um brasileiro ir ao espaço que um planeta desapareceu... Tadinho do Plutão! Será que foi seqüestrado? Vão pedir resgate? Ou foi puro surrupio mesmo?? (E nós com uma fama dos infernos até no espaço!). Mais uma CPI, pode apostar... Ou então uma ação da Polícia Federal de nome esquisito... ‘Operação Buraco Negro’. Se bem que a Operação Buraco Negro poderia englobar muitos tipos de safadeza... Afinal, a política nacional é um enorme, enorme mesmo, buraco negro... E o que dizer então do caixa do PT... Esse então nem se fala!

Chegando ao nível escatológico de escândalos por segundo no Brasil, a mídia vai ter que se esforçar mais para nós tirar das nossas graciosas ‘coçadinhas’ em frente à TV e provocar uma boca aberta ou uns palavrões... Afinal de contas, quem se espanta mais com grampo telefônico nas salas dos ministros do TSE? Ou com ‘dossiês secretos’ circulando por ai? Alias, secretos vírgula! Todo mundo conhecia, mas para variar, ninguém sabe, ninguém viu! Já tivemos anões do orçamento, jardim super-faturado, sanguessuga, um presidente que é uma bela adormecida...Praticamente um filme da Disney! E adivinha quem são os patetas???

sexta-feira, setembro 15, 2006

Tão só palavras


Tinha a nítida impressão que a vida inteira só havia habitado poucos cômodos da vida dele. Talvez somente a sala de estar. Por mais que mergulhasse nunca chegava ao fim, um pântano, nada mais que isso.
Mas mesmo assim guardava aquele papel como uma jóia, preciosidade raríssima. Não se sentia preparada para deixá-lo ir. Nem ao papel nem a densa presença dele em seu pensamento. Já havia decorado todas as frases. Lia e relia em várias entonações. Doces, ligeiras, tocantes, arranhadas, urgentes... E independentemente da versão escolhida sua pele eriçava-se toda ao mero entreabrir daquela folha e até ao ser surpreendida pela memória que lhe assaltava daquelas palavras.

Por vezes se premiava em um dia de sol saboreando cada trecho bem devagar. Em outras, punia-se por se permitir tais vicissitudes. Tinha recaídas. Mas eram às palavras a que ela se dedicava. Dele não tinha hoje mais do que superfície, semi-verdade...

Abriu cuidadosamente as duas dobraduras do papel gasto e reabasteceu-se por hoje. Ao menos por hoje... Dobrou-o novamente, apertou-o contra e o peito e até teve vontade de cheirá-lo de tão caro que o era. Não o fez desta vez... O mantém preso àquele pedaço de papel. Congelado no exato momento em que ela não era tão só, e só palavras.

sexta-feira, setembro 08, 2006

Com a palavra: A NOIVA


Estava em êxtase!
Não só porque naquela manhã havia acordado mais cedo que o normal, ou porque enjoava em demasia, mas finalmente porque aquele dia havia chegado.
A preparação de um ano para a festa e de outros oito para a vida em comum...
Finalmente...
Estavam todos lá, amigos, parentes, aderentes...
E principalmente ele, que não se continha em seu sorriso.
Eu que enquanto entrava só conseguia pensar “Nossa estou escutando a música, está linda, exatamente como pedi!”, “Nossa tem gente chorando e eu não, logo eu que choro no casamento de todo mundo, não estou chorando no meu!”
É... Eu não vi a cor do tapete nem a maioria dos convidados que estavam ali para compartilhar aquele dia tão esperado.
Não vi a maioria das pessoas, mas com certeza senti, que pelo menos a maior parte delas estava feliz e torcendo por nós.
Então, o momento, a festa, não precisa ser descrita porque não há palavras que bastem para descrever a felicidade...

E as amigas, que tanto amo, desculpa pela demora e pela resposta tão mirrada. É que não consegui descrever em palavras a surpresa e a felicidade pela homenagem.

terça-feira, agosto 22, 2006

Velas


No primeiro toque do telefone ainda navegava. Os cabelos dela eram as velas, e imaginava mar, sol, nuvens e tudo que pode compor um quadro perfeito. No segundo toque o navio começou a ir a pique tudo triste como os naufrágios e os dias de terça feira tem de ser.

Foi só então que se viu sentado na sua cadeira azul de sempre, na sua sala hermética e branca, em frente a sua mesa, cercado de caos produtivo por todos os lados. Uma ilha. Desejou o seu navio afundado, desejou asas e uma janela.

Mergulhos... Visto de fora, sorria seu melhor sorriso comercial, respondia com todos os ‘erres e esses’ das respostas genéricas. A mesa dela ao lado da sua. Proximidade torturante das possibilidades irreais. Imaginava-se levantando da cadeira, lhe tomando pela mão, arrebatando-lhe com um beijo ao meio-dia. Ou o inverso, que era o que mais gostava, quando ela empurrava todos os papéis da mesa e lhe puxava pela gravata... Por vezes surpreendia-se ensaiando o momento que pularia de sua cadeira na dela, lhe diria que odeia sua impessoalidade cordial, e logo depois lhe beijaria os pés e todos os seus dedos...

Entende as essencialidades. E nem se esforçou em notar o quando ela lhe amarrou com cordas o pensamento. Por ele, lhe lamberia o corpo inteiro com poesia e lhe embriagaria de imagens. Nem labirintos nem desertos, nem sujeitos nem objetos. “Só sua língua na língua minha, só sua língua na língua minha...”. Porque amava suas inverdades e as verdades que inventava só para ele.

Por ela se fez visível e correu todos os riscos, se fez vulnerável e ingênuo porque assim a fazia acreditar que, por ele, ela podia fazer algo. Fez-se de sofrido, vivido e forte, compartilhando dores, ciência, pintura, fotografia, literatura e novela das seis.

Certeza inabalável de necessidade mútua enquanto ela lhe passava pilhas de pastas para análise, certeza que de tão feridos nunca ousariam ferir. Flechas sem pontas esses olhares. Nunca encara seus olhos fundos. Carregam muito mais do que pode ler. Marido, filhos que quer por um segundo esquecer. Iletrado e analfabeto, é assim que se sente diante dela. Porque só pensa nesse latejar que sua pele provoca ao se aproximar.

Ela sorria mesmo impaciente. Deu três batidas firmes seguidas nas teclas do seu teclado. Depois mordeu a pontinha da tampa de sua caneta preta. Sinal claro e evidente. Ela também sente esses laços que lhes atam. Entrevê o suave movimento de seus seios sobre a blusa enquanto respira.

Ele acha que em algum lugar da sua memória pode encontrar fé. Acha que teve amor e que não sabe bem porque ele secou, esqueceu ou se perdeu. Abram-se as portas. Tem certeza que vai encontrar na curva fechada dos dedos dela enquanto segura o queixo com a mão, pensando efemeridades e lhe sorrindo enquanto guia sua nau de volta ao mar antes do telefone tocar outra vez.

segunda-feira, agosto 14, 2006

Todos os Olhares


Minha Amiga: A Noiva

Em caráter extraordinário, fui convidada a dar uma contribuiçãozinha como “free lancer” ao blog das meninas. A razão desse convite especial: o casamento de Rhafa.
O complicado é que, vocês devem imaginar, há muitas coisas a se falar sobre uma festa de casamento. Tanto se tem que há até quem hesite fazer uma dessas festas somente para não correr o risco dos comentários depois dela. Mas, claro, nem preciso explicar que a natureza dos meus comentários não será daqueles temidos, os abomináveis comentários maldosos.
Essa enrolada introdutória é só pra dizer que não poderei esgotar tudo o que observei durante a festa aqui, nessa oportunidade. Além de tudo, como a proposta é falar sobre o casamento sob três diferentes perspectivas, imaginem só a complicação que não seria se todas as três escritoras (com a ressalva do meu amadorismo) fossem escrever sobre tudo que acharam interessante!
Então, vou pular a parte da Igreja e ir direito ao assunto: a festa.
Dentre os milhares de detalhes “escrevíveis”, como a mesa em que me sentei que era a melhor em termos de conversas interessantes (Mesmo que ainda não me tenha sido dado o dom da onipresença para poder constatar mesa a mesa o teor das suas conversas, a nossa era tão bem “selecionada” que duvido muito que tenha havido alguma que se equipare à nossa), escolherei um assunto em especial para falar: a noiva.
Claro que a noiva é o melhor assunto de um casamento e se ela é sua amiga há mais de cinco anos, tanto melhor! No entanto, essa não era uma noiva comum... A gente sabe que todas as noivas são lindas (salvo algumas exceções), mas a noiva minha amiga... sim, porque, pra quem não sabe, eram duas noivas, mas sobre aquela que não é a minha amiga, que as suas próprias amigas escrevam sobre ela.
Então, voltando. Rhafa que sempre foi linda, como noiva, estava ainda mais. A descrição nada tem a ver com o romantismo que gira em torno da beleza das nubentes. Não, nada disso. Ela é genuinamente linda. E parece até que é a seu contragosto, porque não faz muita questão de expor seus dotes. Mas, no dia de seu casamento, a beleza de Rhafa ficou estampada como numa vitrine e, numa ocasião rara (porque ela não é dada a exibições), estávamos todos a admirando, olhando-a sem cansar. Seus lindos olhos grandes, suavemente destacados numa maquiagem perfeita, transbordavam não só beleza, como também felicidade. E é isso que te desejo, Rhafa, toda a felicidade na vida nova que você irá construir...
Não quero me alongar aqui, afinal, sei que o formato não permite e, além disso, haverá ainda mais duas testemunhas sobre esse evento de hoje (30/07/06). Mas eu ainda preciso dizer só mais duas palavrinhas, aliás, um pouco mais que duas palavrinhas.
Como é bom conversar entre amigos! Uma festa é sempre ocasião de se reunir e se confraternizar e, em um mundo ideal, todas as festas deveriam ser obrigatoriamente divertidas. Ainda bem que o casamento da nossa amiga querida nos deu o gosto de ter umas horinhas de boa conversa e diversão. Tanto que fez surgir em Pollyana essa ótima idéia de que aquelas horinhas fossem registradas aqui pelas três amigas de escola da noiva.
Até logo, blogueiras e Feliz Casamento, Rhafaelly!
Érika
Pensamento de Noiva
Enfim a música anuncia: é a hora da noiva! Os olhares de toda sorte a buscam, e fazem isso sem pensar no que estão demonstrando. Afinal, quem estará observando mais alguém além da noiva? O caminho é aparentemente curto, mas a cada passo ela parece dizer para os convidados: “Você não sabe o quanto eu caminhei pra chegar até aqui...”
Enquanto ela segue o seu percurso e a beleza já foi devidamente elogiada, é impossível não tentar imaginar no que ela estaria pensando... Outro dia uma me disse que só pensava: “Eu não acredito que ele penteou o cabelo de lado, não acredito!” E no mesmo dia outra disse que pensava: “Que tapete é esse??? Não foi o que eu escolhi!” E mais uma: “Meu Deus! Estas são as tulipas???” E, numa versão mais triste: “O que é que eu tô fazendo de minha vida?”
Sinceramente, deveria haver uma pesquisa daquelas inglesas sobre aqueles pensamentos, porque haja domínio de emoção para pensar coisas tão práticas enquanto no rosto dela o que vemos é tão somente harmonia e leveza... Mas, voltando, o que a noiva do dia estava pensando eu ainda não sei. O que sei é que não condeno em nada os pensamentos acima, afinal, é tanto caminhar pra chegar até ali, são milhas e milhas antes de dormir.
E aqueles pensamentos são somente expressões do mais profundo desejo de que o sonho seja igualzinho aquele tantas vezes sonhado. O dela estava sendo, e foi até o fim. Não sei se os sentimentos assentaram e ela conseguiu amainar a ansiedade percebendo a beleza de tudo em volta, e aí incluo até o rotineiro ataque à mesa de doces e o trabalho de formiguinha das senhoras que desfazem os arranjos para levar uma bela flor para casa. Mas acho que a mim, mera convidada catadora do buquê, só me cabe rememora-la: “Amiga, foi tudo muito lindo! Parabéns!”
Lorena.

Sorriso de Infinitas Cores

Definir. Descrever. Possível??

Proposta saída de dentro dos meus eternos arroubos. (Você bem sabe...)

Vi-me diante de algo que nem sempre acontece quando estou vibrando em sensações, fiquei sem palavras e aplaudindo de longe, quase que espiando pelo buraco da fechadura, ou assistindo no escuro do cinema incógnito as cenas de uma felicidade que me atropelou em plena manhã de domingo...
Entender é um verbo injusto.

Mas ao vê-la sorrir tão verdadeiramente e resplandecente ao parar no altar me fez entender sem razões e aceitar sem condescendência... Algo próximo do que acredito que um dia já descreveram como ‘sentir-se feliz pela felicidade de alguém’... Fato estranho nos dias de hoje...

Eu vi naquela manhã um sorriso de alma, de corpo inteiro.

Lembrei de todos os nossos dias como flashes... Lembrei de como me é uma pessoa querida, e de como sempre antes de me julgar sempre entendeu e de como lhe sou grata por isso.

Lembrei e me fez sentir que a felicidade é realmente algo como você sempre me pareceu: Simples e sem explicações.

Existe um ramo da religião judaica que acredita que as palavras possuem uma carga definida de força. Mas que para que cada uma delas possa passar essa energia é necessário que se ultrapassem as letras, que sejam ditas e repetidas pelo que contém.

Para você eu desejo verdadeiramente todo o bem, aquilo que há de bom, e toda beleza.
Pollyana

terça-feira, julho 25, 2006

Côncavos e Convexos

Horário nobre.

Nova novela das oito na telona escrita por Manoel Carlos, que a maioria define como "O novelista da vida real”.

A proposta da trama seria algo como aproximar ficção e realidade, inaugurando um novo estilo de “novela-verdade” (Novo??) com quadros de depoimentos de pessoas reais, comuns e ordinárias falando sobre suas experiências pessoais. Até ai tudo bem. Tudo ótimo. E veja bem, tem de todas as opções de estereotipos; O chifrado, o tímido, o galinha, a ‘bem sucedida’, a heroína mãe-de-família...

Devo confessar que talvez seja a parte que mais me chamou atenção, já que não sou muito dedicada às novelas, mas muitíssimo viciada na modalidade semi-esportiva de jogar tempo ao ar... Acho que só ninguém esperava ver uma mulher no alto de seus 68 anos confessando em rede nacional que até os 45 anos nunca teve um orgasmo.

Temos que admitir. É chocante.
Não só pela coragem da exposição, pela temática abordada naquele horário e todo esse bláblá ético-educativo-social, como, obviamente, pela dura realidade de milhares de mulheres que, em seus sofás naquela noite, sentiram-se irmãs do sentimento experimentado por aquela senhora corajosa, mas que nunca confessariam...

Por suas próprias palavras disse que achava normal não sentir nada: "Pra mim era tudo normal, o homem terminava e eu também".

Mulheres do Brasil! Existe solução e aquela senhora aos 45 anos, sem psicólogo, estimulante ou vibrador encontrou a resposta. Estam curiosas???

Disse que um dia foi dormir ao som da música Côncavo e Convexo, de Roberto Carlos, e ao acordar estava com "as pernas suspensas, a calcinha na mão e toda babada".

Putz! Emocionante! Imagino quantas mulheres não engasgaram com o café e quantos homens não tremeram nas bases quando por fim ela decretou: "Homem pra mim não faz falta, eu mesma dou um jeito".

Não faltaram protestos da Igreja, dos defensores da “moral e dos bons costumes”, do Congresso Nacional, quiseram abrir até uma CPI(Imagino, afinal, abrem-se CPIs mais do que botecos no interior...) mas no final das contas, a mulher acordou toda babada mesmo e o resto é que ficou só assistindo com inveja...

Bom, quem ai estiver querendo ouvir por completo o “emocionate” depoimento da senhora polêmica pode clicar no link abaixo:
http://www.youtube.com./watch?v=7KxrdNmhMDw&mode=related&search=páginas%20da%20vida

Agora, quem quiser conferir os efeitos “astronômicos” da tal música do Roberto Carlos, pode clicar nesse outro link sem medo de ser feliz! (Mesmo não fazendo meu estilo, por precaução, recomendo o babador... ).

segunda-feira, julho 17, 2006

Superman - O retorno



Sábado à noite e hordas de jovens (chamar alguém de jovem não é o cúmulo da caquetice??) na média dos 15 anos fazendo fila para ver o novo Superman Returns. Até ai tudo normal, sábado, cinema, fofoca e pipoca combinam, mas ver a garotada aplaudir no final do filme surpreendeu (e veja que eu estava em João Pessoa e não em Campina para os maldosos de plantão! “Afinar, nois somo matuto mais nois somo jóia!”).

Como é que aquele cara de cueca por cima da roupa e capa vermelha pode ainda comover a geração PlayStation?
Talvez o único capaz de responder esta pergunta seja o diretor Bryan Singer, que também dirigiu os igualmente bem sucedidos filmes X-Men e X-Men 2, o que deu um excelente know-how nos roteiros baseados em quadrinhos. Mas diferentemente dos dois anteriores, que lidavam com o sentimento de inadequação, (e muita porrada, é claro!) comum à boa parte da faixa etária em questão, esse filme fala de solidão (além do fato de ter menos pancadaria)...

E para me fazer entender menos ainda, pensando eu que iria encontrar um filme de visual ultra Hi-Tec (tipo o último Homem-Aranha), o diretor optou (e fez uma ótima escolha, diga-se de passagem...) por respeitar o passado da capa vermelha, com um visual ligeiramente retrô, das roupas até o clássico tema da saga (tan-tan-ram, tan-tan-tan-ran... Fiozinho na barriga...).

Não teve como não se sentir um pouco nos antigos episódios do início dos anos oitenta com o eterno ‘Super’ Christopher Reeve. Ah, e por sinal, não dá para deixar passar desapercebida a incrível e ‘coincidente’ semelhança do ator Brandon Routh com o saudoso Reeve, o fazendo lembrar não só fisicamente como nos gestos e na voz.

Claro que também é necessário confessar que só fui ver o filme porque recebi um e-mail que entre outras ‘curiosidades’ dizia que todas as cenas do Brandon tiveram que ser tratadas no computador, pois ele com aquele colan estava, digamos, ‘viril’ demais, muito volume na cuequinha... (risos)

Pois é, olhei mesmo, não teve como evitar... O diretor disse que esse foi o boato mais bizarro que já ouviu, afinal eles não iriam gastar milhões de dólares para alterar esse ‘detalhe’ digitalmente (pois é, Emplastro Sabiá existe para quê, né?)... Boato ou não, o Brandon é realmente lindíssimo, encaixou perfeitamente no papel e ainda ficou ótimo na roupinha!

Um filme que vale a pena conferir.

terça-feira, julho 04, 2006

Brasileiro não desite nunca! (É mesmo??)


Fico pensando se o brasileiro gosta mais de futebol ou de feriado. Questão difícil de responder... Principalmente quando as duas possibilidades estão aliadas e um país resolve parar para assistir os jogos da Copa e ainda um meio feriado de lambuja ao sair do trabalho às 3 da tarde, dando aquela escapadinha estratégica que irrestritamente todos ansiavam.

Febre Amarela nas ruas (mas para essa não creio haver vacina), moda momentaneamente nacionalista, e gente cantarolando “Euuuu.../ Sou brasileiro/ com muito orgulho/ com muito amooorrr...” Nem dá para não dizer que é ilusoriamente comovente....

Está certo que tem aqueles ‘do contra’ eternos que torcem até para a Costa do Marfim, mas não dão o braço a torcer para a camisa amarelinha, mas no fundo (respeitosamente no fundo) bem que ficam vibrando contidamente mesmo com aquela cara de raiva quando o Ronaldinho Gorducho marca um golaço!

São poucas as coisas que vejo os brasileiros se envolverem, para listar pela ordem de comoção: Futebol, final de novela e oportunidade para chamar político de ladrão (e isso é o que não tem faltado!!!). Outro dia mesmo escutei uma dona de casa no supermercado discutindo as táticas de jogo do técnico PEREIRA!!!

Eu da minha parte sou uma torcedora sazonal genuína. Só de 4 em 4 anos, e olhe lá. Mesmo assim ainda me arrisco nas discussões de mesa de bar discutindo os quilos a mais de um, os anos que sobram do outro, as zebras e os favoritos...

Em falando de favoritismo, sempre tive minhas teorias pessimistas por natureza que favorito no Brasil só se... Alguém ai lembra do Fernando Pessoa e o cavalo Baoloubet du Rouet? Refugou! E a Diane dos Santos e suas piruetas nas olimpíadas? Refugou! E o time do Brasil? É claro que vai refugar!!!

O Brasil em silêncio na frente da TV, e advinha? O time refugou! 1X0 para França e desta vez sem convulsão, água batizada, ou qualquer teoria da conspiração para justificar...E sim um time apático, coordenado por uma guerra de egos, que carregava nas costas (além de milhões em patrocínios publicitários) a esperança de um povo inteiro movido a pão e circo (e onde está o pão mesmo???) bem no ano eleitoral (desespero em Brasília)...

Depois da derrota, de toda a decepção ainda escutei gente dizendo que daqui a quatro anos ‘agente leva’ e vai ser hexa! Que se o Brasil perdeu não tem problema não, ao menos os nossos ‘hermanitos’ voltaram um dia antes!!! Ainda tiveram outros que já até adotaram outras seleções (como a de Portugal e o nosso velho conhecido Felipão).

A frase publicitária do Governo Federal afinal até faz algum sentido, brasileiro não desiste nunca (Lula que o diga)! O único problema é que na nossa seleção (naturalizados Espanhóis a parte), contam-se nos dedos quantos dos convocados ainda são realmente brasileiros...

Não se pode dizer que do lado de cá do oceano não se apelou para tudo; patuás, mandingas, todos os santos, meia velha da sorte... Mas nem todas as formas geométricas incluindo quadrado mágico, que ‘estrategicamente’ virou triângulo mágico e mágica que é bom... Minha opinião de ‘expert’ é que deveríamos ter jogado com, no mínimo, um decágono mágico... Afinal seleção no sentido mais real da palavra, tivemos, mas os poucos escolhidos nunca foram o que no futebol há de primordial, um time.

segunda-feira, junho 26, 2006

A dança



Sorriso de todas as intenções dedutíveis. Passos lentos do aproximar de corpos que não se permitem.

E do instante fez-se o agora, e da palavra memória ausente. De real a sua voz intrusa raspando no meu ouvido, repetindo suplicante o meu nome, arfante... Repetindo, repetindo, repetindo como se quisesse entrar em mim assim... E entrava... No ritmo do ofegar, banhada pelo hálito quente no pescoço, derramando desejo intenso de ter, de mais, de absoluto, de tanto, de tudo, que faz saber que o devorar é pouco...

E sem saber, eu sei o quando me quer, e sem saber eu sei dançar a tua dança. E no roçar das roupas cheias de mãos, flashes de gestos desconexos, fechando os olhos cheios de ti e sentir o vibrar do teu corpo como cordas de um violão, arrepio que te embala ao deslizar meus lábios que pulsam, que chamam e mordem os teus por capricho, e os torna a ponte dos atos e dos desejos.

Tua mão inteira me conduz fechada na curva dos meus quadris gemendo cativo das ondas da minha fúria, desse meu sentimento guloso de ti. Suga o ar gélido que entra no teu sangue, e percorre o teu corpo que arde, experimenta da vontade obtusa quando afasta as minhas pernas cheio de "ais", esvaindo-se todo enquanto a tua boa me sussurra na orelha: "Não deixa, não deixa..."

sexta-feira, junho 16, 2006

Papo Calcinha



Dia desses um amigo me confessou que a maior redenção das horas a fio que um homem passa tentando derreter o juízo de uma mulher é quando finalmente consegue abrir o zíper da calça dela deixando aquele singelo lacinho dar as graças ao mundo...

Eu, da minha parte, nunca tinha pensando em quanto poder os nossos lacinhos podem ter, o fascínio, o fetiche que podem provocar... A pesar de ter inconscientemente (alguém acredita???) exercido algumas vezes, necessário confessar...

Ah, benditos lacinhos!!!

E se eles soubessem (e que não saibam, e se souberem que esqueçam!) que nem sempre existem lacinhos sensuais e sempre dispostos a ‘entrar em campo’? E se eles soubessem que tem dias que saímos de casa com aquela calcinha enorme bege (desculpem a grosseria, mas essa não vai dar nunca!) e que a maioria odeia usar fio dental, ou que aquele monte de babadinhos convidativos na maioria das vezes só faz pinicar?
Quem nunca ficou semi-histérica com a calcinha indo parar em lugares aos quais não foi convidada? Quem não deu aquela "puxadinha" básica dentro do elevador? quem não tem aquele calcinha velhinha, quiçá com algum furinho, de estimação?? Quem nunca passou por uma "calcinha justa" que atire a primeira pedra!

Mas não quero aqui arrasar o imaginário de ninguém, e por tanto, há de se dar o devido respeito à peça que evoluiu muitíssimo (felizmente!) desde o tempo das vestes longas, passando pela ostentação dos séculos 17 e 18 e seu verdadeiro arsenal de acessórios, até o início do século 20, chegando hoje a gozar dos benefícios da tecnologia e até da gastronomia (estão aí as calcinhas comestíveis que não me deixam mentir!!!). Então homens, podem ficar sossegados porque nem tudo é calçola folgada e bege nesse mundo!

E já que se trata de um papo calcinha, ou seja, feminino por excelência, e estamos falando dos nossos benditos lacinhos perseguidos, contem suas histórias calcinhas (as infortunadas e as bem–sucedidas também!), afinal, ninguém precisa se revelar!

sexta-feira, junho 09, 2006

As Sindromes



Achei por bem esclarecer aos infortunados leitores desse Blog os motivos de tamanha demora nas nossas postagens... (É verdade, pode não parecer, mas somos bem educadinhas!).

Eis que as colaboradoras do ‘Brincos’ estão sofrendo de algumas síndromes, que assim como as participantes, variam nos seus motivos mas pouco nos seus efeitos, qual seja, a loucura patente, semblante desorientado, atração fatal pelo exagero máximo, complexo de perfeição entre outras facetas menos glamurosas, que, reservamo-nos ao direito de ocultar, caso contrário poderíamos ser interditadas a qualquer momento...

Vejamos a primeira, que está sofrendo da síndrome do ‘casórium proximum’ e que segundo registros, diz que a vida dela só continua (ou começa, sabe-se lá!) depois da cerimônia... Ouvi dizer também que devido a alguns fenômenos estranhos, como acordar com a cama cheia de arroz, só enxergar vestido branco pela frente, estar meio neurótica sonhando com damas de honra, buquês e bolos ela resolveu temporariamente afastar-se um pouco de suas atividades literárias em benefício de sua saúde mental. Mas fica a promessa que assim que voltar da Lua-de-Mel vai aparecer por aqui com suas tiradas sempre inteligentes. (Boa parte é brincadeirinha, mas a verdade é que estamos com saudade viu Rhafinha!).

Nossa outra colaboradora, baratas a parte, está sofrendo da síndrome do computador... Diz que quer ver tudo pela frente, até o Lula com chapéu do MST, mas não quer ver a tela do monitor... É, eu sei, Lula ninguém merece, mas com os votos de pleno restabelecimento que desejamos ansiosamente a volta da nossa Luzinha em pleno vigor e seus textos sempre surpreendentes e criativos aqui no ‘Brincos’. (Também tô com saudade repetitiva viu Ló!)

Por último, esta interlocutora que declarou ontem em suas auto-análises-pseudo-freudianas que está sofrendo de Neo-Banzo...E ai fico só esperando algum analista escrever alguma tese robusta de 400 páginas sobre o assunto para justificar a real preguiça horrenda de escrever...

De qualquer maneira, qualquer hora pintamos por aqui, numa lua cheia, no meio da tarde de sábado, depois do cineminha, ou no casamento, quem sabe? Afinal, o difícil mesmo é nos deixar longe dos pitacos e devaneios...

terça-feira, maio 30, 2006

Traumas Infantis


Mesa de bar e doses não controladas de caipiroska em boa coisa não resulta, não é mesmo? Muitos assuntos 'profundíssimos' depois, e cansados de falar do problema da violência no Brasil, surgiu a sensata proposta de cadidatura de Marcola (Chefe do PCC) para presidência, afinal de contas o homem da noite para o dia acabou com o trânsito em São Paulo, reforçou o policiamento nas ruas, uniu os partidos em um objetivo comum, isso tudo por celular, imagina em um Gabinete...
Em goles mais amenos de bebida, opa, digo, de conversa, lembramos com certa nostalgia embotada das lancheiras escolares e as gorobas que nossas mães já nos fizeram comer ou beber tudo em nome de bochechas rosasdas... Eu da minha parte sempre tive trauma profundo da banana, dita saudável, que minha mãe colocava na lancheira, e quando abria na escola aquele cheiro inconfundível que dominava a sala e todos os outros coleguinhas com seus lanchinhos 'chiques' de bolachas recehadas, chocolates e sabe-se lá mais o quê... Ainda tinha aquelas garrafinhas térmicas que derramavam todo o suco e o sanduiche de queijo enrolado em guardanapo (no final os guris comiam papel e queijo achando que estava tudo muito gostoso, principalmente com o gostinho do suco que derramou, lembra?)
Mais traumático que isso só o famoso suco de beterraba-laranja-tomate e cenoura que nos faziam engolir guela abaixo dizendo que era para "ficar forte".. (urrrggg). Pois é, mais maluca que a minha mãe então era a de um amiga que incluia nessa receita "adorável" pêra.... Alguém sabe me dizer para quê serve a essa imitação de maçã????
Traumas ou não, ainda sinto o cheiro da lancheira só de pensar nela... Não sei se para ficar forte, mas ao menos serviu para alguma coisa....

terça-feira, maio 23, 2006

Decidindo

Decidindo como vai ficar meu humor hoje...

O dia vai ser longo...
A noite vai ser curta...
Minha pressão está baixa...
O dolar está em alta...
A economia está em queda...
É... E o meu humor certamente indo junto...

terça-feira, maio 09, 2006

Os meninos e seus brinquedos


(Semelhanças com fatos reais não são mera coincidência.)
Evo olhou para os quatro cantos e nada viu que pudesse fazer. Sentiu-se em uma situação que caso fosse adulto chamaria de impasse. Uma vontade enorme de brincar e sem ter com o quê.
Logo lembrou do coleguinha, que depois de ser pobre, iletrado e mal educado, agora era metido ao que sua mãe chamava de “novo rico”, sempre metido em roupinhas bem cortadas e feitas por encomenda, uma aparência eterna de juventude promissora. Origens iguais, casas vizinhas, mas uma enorme distância os separava.
O Luiz era um garoto engraçado, cheio de fases e manhas. Por vezes o viu passar na rua enquanto os outros garotos todos da vizinhança apontavam-lhe os dedinhos indicadores impiedosos o chamando de “radical”, mal entendendo o Evo o que diabos “radical” significava. Agora, muito mais “arrumadinho” os dedinhos de antes recolhiam-se aos bolsos, olhares voltados para o chão e fazer o quê? Agora o garoto estava por cima, maior casa do bairro e tudo mais.
Convidar aquela figura meio estranha para sua casa poderia não parecer a melhor idéia do mundo, mas só em pensar nos vários brinquedos que traria... Porque pensar duas vezes??? Meteu o a mão no telefone e estava feito. Dez minutos depois lá estava Luiz cheio de tudo aquilo que lhe faltava e que sua imaginação quase não conseguia alcançar.
Tudo muito bem enquanto o gosto de novidade era maior do que o de aborrecimento de ter que submeter aos caprichos do tal do Luiz. Foi ai que lembrou do que seu melhor amigo lhe disse: “O quarto é seu. Aqui é você quem manda”. O Huguinho era esperto, isso sempre soube. Encheu os pulmões de ar, e bravejou finalmente:
- “ Luizinho, o negócio é o seguinte, vai deixando esses seus brinquedos ai no chão e pode ir embora”
- “Hã???”
- “ É isso mesmo o que você ouviu, vai levantando logo enquanto eu ainda estou calmo e deixa tudo que você trouxe ai, porque o quarto é meu, e aqui sou eu que mando.”
- “Mas como é que pode isso, você me chama para cá, eu fico com você, trago todos os meus brinquedos e agora você me vem com essa?!? Enquanto todos os outros garotos nunca lhe deram atenção eu fui o único que sempre estive do seu lado. Somos tão parecidos...”
- “É, pode até ser, mas agora é assim, e se você ainda quiser os MEUS brinquedos, eu até que posso de alugar, mas o preço eu que faço... E nem adianta espernear porque chamo meu pai, minha mãe e até o Huguinho, você quer que eu chame o logo o Huguinho?? Se eu fosse você não faria isso... Vai ser pior...”
Depois de um pouco pensar, logo o Luiz viu que não haveria o que fazer. Levantou-se puxando as calças, e resignado disse:
- “Mas o que eu digo lá em casa? O que é que vão pensar de mim??”
- “Ah Luiz, isso ai é com você, mas vê se não volta chorando porque vai pegar muito mal, diz só que você acha até certo o que eu fiz, e que vai tentar negociar. Eles vão acreditar, afinal, aquele pessoal da tua casa acredita em tudo mesmo....”

quinta-feira, abril 20, 2006

Diário de um Cucaracha


A nossa história começa em 1963, no Paraguai, numa rua de notívagos de nome nao menos boêmio: Simón Cucaracha. Ele, que foi um grande amante dos bons charutos e das belas prostitutas francesas, em seus dias mais inspirados jamais imaginaria que a tal rua levaria seu nome.

Talvez nem tivesse orgulho, pois todo boêmio faz promessas vãs de sair dessa vida, e até vislumbra planos para tal dia. Mas a vida boêmia é quase como um dom, e dela os boêmios não poderão livrar-se facilmente.

E na semi escuridão de uma dessas noites bêbadas, estava lá outro personagem dessa história: o pai de Geraldo. E foi numa madrugada dessas de arroubos, suor e uns dois bons poemas que todo capadócio sabe de cor, que Geraldo foi concebido.

A mãe dele, que poderia até receber um nome se não fosse tão rapidamente desaparecer de nosso relato, derramou um longo pranto ao descobrir que os planos daquele boêmio não eram exatamente o de construir uma vida estável ao lado dela no Brasil. Ele, na verdade, tinha outros planos, que foram satisfeitos alguns minutos depois daquela conversa de sonhos.

Alguns meses depois, no Espiríto Santo, já em 1964, estaria Teresinha segurando no colo aquele rebento de pai desconhecido e de mãe inominada. O menino, que quase teve Teresinha como mãe, foi enviado para a casa de uma irmã dela, que tinha mais posses e propriedades e, portanto, boas chances de cuidar sem maiores afobamentos de um pequeno abandonado.

Consuelo nunca escondeu de Geraldo a sua procedência incerta, nem que a sua cestinha foi posta primeiramente na casa da Tia Teresinha. O nosso Geraldo, apesar de nao ter maiores problemas com a sua história de vida, sempre olhava para a Tia Teresinha e a imaginava como mãe, o que lhe era insuportável diante dos tabefes e beliscões que seus primos sofriam publicamente.

Teresinha não era uma pessoa esperta, sagaz, mas também nao era desprovida de alguma inteligência mediana. No entanto, todos na família a tinham em conta como pessoa de muita sabedoria e cultura. Ela não lembrava bem de onde surgiu o título, mas gostava dele e se portava como tal, e a essa altura do relato até acredita realmente que é mais esperta que os outros.

Ela não recorda, mas nós temos como voltar um pouco na história e revelar o momento em que Teresinha passou a ser tida como culta. Certamente ela não é a única pessoa que é tida por algo que não é, pois o que não falta no mundo é uma espécie de complexo de aquiles generalizado.

Vamos lá. Os aparentados de Teresinha sempre concordaram que ela era a pior pessoa para presentear em amigo secreto de final de ano. Não é vaidosa, o que exclui a maior gama de presentes femininos; não é afeita a serviços domésticos, o que excluía a porcentagem que restava para dar presentes a uma mulher nos anos sessenta.

O que ano a ano se repetia era a insatisfação pública de Teresinha ao receber o seu presente. Até que em 1967, quando Geraldo ainda era um bebê e por isso não tem como recordar a época em que Tia Teresinha nao era tão culta quanto hoje se sabe, o Tio Antônio, esse sim esperto merecidamente, comprou um livro para Teresinha.

E ao iniciar os enfadonhos elogios que se faz antes da entrega de presentes natalinos, ele inovou. Para o espanto das cunhadas perfeccionistas, o presente nao estava embalado. Era um presente para um homem, pensaram todas. Antônio levantou-se e teceu algumas considerações em torno do seu amigo oculto: "...É a pessoa de maior cultura, indubitável sabedoria, desde sempre conhecida por todos os familiares como uma grande conselheira, profunda conhecedora de diversas ciências!"

Todos, com exceção de Teresinha, que cochilava na cadeira de balanço, estavam curiosos ante a descrição. Ora, se não era o próprio Antônio, quem seria? Todos aguardavam invejosos o momento da revelação. Para o assombro geral, era Teresinha! A amarga e insossa Maria Teresa, que todos chamavam Teresinha, mas longe de ser por afeto ou baixa estatura, e sim pelo comum hábito local das Teresas serem logo transformadas em Teresinhas.

Ela se levantou e sorriu, recebeu o presente sorrindo, feliz pelos elogios e indiferente quanto ao livro. Ela é daquelas pessoas que quase nunca sorri, e que são tão sérias que os seus rostos parecem fazer careta quando esboçam um sorriso. Por isso, a cena de Teresinha sorrindo ao receber o livro jamais saiu da lembrança dos familiares. E assim ficou firmado um costume familiar: para Teresinha, deve-se dar livros, pois ela é a única verdadeira intelectual da família.

Ela, como ficou dito, gostava mesmo era dos elogios que eram feitos antes da entrega do seu novo livro. Mas ela, na verdade, nunca os lia. E até os organizava em suas prateleiras por tamanho e cor. Ora, todo mundo sabe que o que nao é contestado, confirmado está; por isto Teresinha gozou até a morte da fama de boa leitora.

Nesta família, como não raro ocorre também em outras tantas, todos carregam um estigma. Há o tio avarento, o cunhado incoveniente, a tia ranzina, a tia dócil, o primo solteirão, a prima bonitona. E Geraldo, já com 16 anos feitos, tinha um estigma desagradável: o primo adotivo e filho, quiçá, da puta!

Crispava-se de raiva quando os outros utilizavam sua cruz, quer para xingá-lo, quer para adotar uma conduta piedosa. Convicto de que algo deveria fazer para mudar este fato, Geraldo procurou nos livros de Tia Teresinha um termo polêmico, desses que exaltassem a luta contra os militares, mas que não fosse de óbvia compreensão. Afinal, ele não queria chocar tanto o Tio Antônio, que era militar, mas que ele tanto gostava.

Em sua casa, para evitar maiores confusões, após os parabéns cantados para a rica Consuelo, fez-se o incompreensível silêncio que se faz ao partir o bolo. E Geraldo, que não era covarde, mas que também não tinha maiores arroubos de coragem, gritou: "E viva os bolcheviques!!" Os pequenos o acompanharam no viva mesmo sem saber do que se tratava, e os adultos o olharam com espanto.

Após um breve silêncio, Tio Antônio, entre desapontado e desafiado, acabou com as expectativas em relação à sua reação e disse: "Ora, ora, ora, temos um revolucionário!" Deu tapinhas indulgentes nas costas de Geraldo e saiu. Esta foi a última vez que Antônio foi visto na casa de Consuelo.

Esse episódio foi suficiente para que Geraldo pensasse que ganhou o estigma de primo revolucionário. E isto o deixou bem feliz, mesmo ele se deparando com o impasse de não saber como agir tal qual.

Conversando com uma menina hippie com quem teve sua primeira experiência sexual, detalhe completamente desnecessário que nada construirá no relato, Geraldo perguntou como agir para parecer um grande revolucionário. A menina disse que ele deveria começar comprando livros. Ele não entendeu, mas ela deveria saber o que dizia.

E ele comprou muitos, muitos livros alternativos. Mas um pequeno problema tão comum foi o responsável por Geraldo não se tornar o sonhado líder que faria com que todos esquecessem o seu passado paraguaio: falha na comunicação humana. Ele comprava livros, como recomendado, mas os dava de presente, ao invés de lê-los .

O que Geraldo ganhou foi o estigma de grande presenteador de livros indesejados. E por isso, a cunhada organizadora do amigo oculto todos os anos dava um jeitinho brasileiro dele coincidentemente tirar a Tia Teresinha. Assim, todos ficavam felizes! E também assim, as prateleiras de Tia Teresinha foram ficando recheadas de livros aos montes, livros que ninguém lia.

Só que, vez por outra, algum parente com novas metas de início de ano começava a ler, mas não concluía, deixando uma pequena orelha em uma das primeiras páginas do livro. Apesar de ser uma família sem maiores hábitos de leitura, essas pessoas eram organizadas, e Tia Teresinha odiava orelhas nos livros. O que fazia com que todos ratificassem ainda mais a imagem de apreço que ela teria por seus livros.

Certa vez, o sobrinho moleque da família fez orelhas em todas as páginas dos livros de Tia Teresinha, o que resultou nuns dez ocos cascudos e numa atitude radical: Teresinha cortou as pontas de todos os seus livros! Assim, ninguém mais faria orelhas em livros tão intocados. A fama de inteligente que ela tinha era sempre reiterada por esse ou outro espasmo de loucura.

Tia Teresinha morreu em 1985, sem tirar uma grande dúvida que há alguns anos lhe afligia: por que Geraldo insistia em errar seu nome nas dedicatórias, escrevendo-o ora com z, ora com s? Ela não chegou a saber, mas nós, onipresentes no relato, sabemos, e vimos Geraldo comprando livros de sebos que já estavam dedicados. E algumas vezes era de um sobrinho Geraldo qualquer, para uma Tia TereZinha, e outras vezes, para uma Tia TereSinha, o que fazia com que ele volta e meia mudasse a grafia do nome dela.

É porque alguns anos passaram, e Geraldo já estava cheio de dar livros na tentativa de fazer pegar aquele estigma tão difícil. E por isso ele comprava qualquer um, revolucionário ou não, mas com uma dedicatória de um geraldo para uma teresinha ou terezinha quaisquer. O último livro que a deu, e isso ele jamais chegará a saber, ironicamente fazia alguma referência a seu passado paraguaio.

Era um livro de Henfil, que foi parar num outro sebo, vendido pela filha mais velha de Tia Teresinha que estava louca pra se livrar daquele amontoado de traças. Até conseguiu um bom dinheiro com a livrarada toda, mas jamais se livraria do peso na consciência de ter vendido livros dedicados. No entanto, se tivesse um hábito um pouco maior de leitura, saberia que outros tantos fazem isso.

Nós, no entanto, temos que agradecer a essa prima pouco leitora de Geraldo e filha ingrata de Teresinha, pela venda feita ao sebo, ou não estaríamos aqui a relatar essa história. O último livro passou por outros geraldos e outras tantas teresinhas, passou também por algumas marias, etc, etc, até chegar em João Pessoa, distante de seu passado ingrato e de seu estado suprimido entre outros fortes.

Até que uma estudante de direito, que também mereceria um nome se não fosse tão corriqueira sua passagem no relato, assustou-se ao ver uma barata enorme sobre um livro de Cecília Meireles. Os sebos são mesmo muito sujos. Ela olhou melhor, era sua miopia lhe pregando peças, a barata fazia parte da capa do livro.

Pegou com atenção aquele estranho livro sem as pontas das páginas, dedicado a uma tal Teresinha. E decidiu ao ver o nome Henfil, alguém por quem tinha grande admiração, que era aquele o presente que ela estava procurando tanto para dar ao seu amado. Mas essa é uma outra história.

quarta-feira, abril 19, 2006

O Conforto das Razões Inexplicáveis


O Conforto das Razões Inexplicáveis



Sento-me na frente da TV esperando a próxima desculpa esfarrapada pelo atraso dele desta vez, e lembro de uma história muito antiga que uma vez me contaram sobre a origem da satisfação masculina de correr junto com mais outros tantos homens suarentos por mais de uma hora.

Diz a lenda que existia um ritual antiqüíssimo , originário dos povos ‘Futibulis’, na região comumente conhecida como ‘Gôles’, imagino que próxima, muito próxima da atual Mongólia.Consistia em uma simples e rudimentar ritualística, onde os machos da tribo componentes da seita secreta vestiam-se e paramentavam-se para a execução dos atos a ela concernentes, com o objetivo de livrarem-se de todos os pensamentos racionais, algo que em outras filosofias se repete, citando-se como exemplo a busca pelo nirvana.

As posições exercidas por cada um dos mebros eram bem delimitadas na ritualística, variando de acordo com as habilidades demonstradas, papel de liderança, e, é claro, a hierarquia ‘Futibulis’que poderia ser determinada ou identificada através do título de ‘Dono do Círculo de Adoração Sagrada’, que dizem os historiadores, tratar-se do que hoje inofensivamente chamamos de ‘bola’.

Durante o curso da celebração, todos corriam em uma área aberta em formto retangular gritando palavras incompreensíveis, gesticulando e suando, e se possível, tendo o máximo de contato físico de canelas com canelas até que esta região do corpo ficasse roxa e bastante machucada. O ponto alto do ritual era quando um dos membros da seita secreta conseguia habilmente introduzir com bastante estardalhaço o ‘Circulo de Adoração Sagrada’ em um grande retangular altar. Neste momento, todos gritavam, faziam gestos ou jogavam-se uns sobre os outros até que alguém sufocasse.

Findavam-se todos os atos com a emissão de um som mágico emitido pelo ‘Grã Mestre da Sabedoria’, que segundo estudos ritualísticos trajava-se de sempre de preto, mas nem sempre era um indivíduo bem quisto entre os demais. Exaustos, machucados e sujos, bebiam em comemoração um líquido alucinógeno de coloração amarelada e espumante e que deveria ser servido gelado.
Sinto-me muito mais aliviada hoje pelo homem ter evoluído desses tempos inglórios. Só assim não preciso tentar explicar aquele sorriso estranho do meu marido quando ele me chega atrasado toda terça á noite, suado, sujo e arrebentado e mesmo assim satisfeitíssimo. Tira as chuteiras e as meias, me mostra uma unha estropiada e roxa, olha para mim feliz e diz: “Acho que essa vai cair”.

quinta-feira, abril 06, 2006

Com açúcar e com afeto (para ler ouvindo)



Explicar, aquilo que se chama dar nome aos sentimentos, eu nunca soube. Mas hoje, sem saber como, até porque já disse que não sei explicar, eu sentia que ia ser diferente. Durante a manhã, depois da novela reprisada, fiquei olhando pela janela. Não sei quanto tempo passei olhando os passantes, mas quase perdi a hora e, imaginem só, por um nada não atraso o almoço. Você vai chegar com fome. É preciso estar tudo pronto, porque hoje vai começar a ser tudo diferente.
Colocando a mesa, vi o ponteiro pequeno avançado, e calculei o atraso. Eu conheço você, sei que está atrasado porque vai me trazer uma surpresa, afinal, hoje começa tudo novo. Nossa! Então já que vai me trazer um presente, preciso melhorar a comida. É melhor fazer aquele doce, assim você não resiste.
Enquanto faço o doce penso em tanta coisa nova que vai acontecer, o carteado com os casais amigos, as longas conversas antes de dormir, o olhar de cumplicidade quando um já sabia o que o outro ia dizer, o toque carinhoso pra ninguém ver... E quase choro quando me imagino abrindo os olhos de manhã e não sentindo a companhia insistente da solidão.
Depois disso, ainda espero o ponteiro pequeno avançar mais no espaço branco. Eu sinto fome, deve ser ansiedade diante de tanta novidade acontecendo. Você entra, eu disfarço o cochilo, e olho para as suas mãos buscando a surpresa que já espero. Por que elas estão vazias? Você, depois de um sorriso espaçoso que me faz pensar que aquele é meu melhor presente, diz que trabalhou muito, e que está sem fome. Eu vou seguindo você até o quarto, e deito na cama enquanto penso que a minha fome também passou. Fico te olhando tirar os sapatos, a roupa, enquanto fala e fala sobre a manhã grande que teve. Vai entrando no banheiro, e me pergunta, sabendo que a resposta não virá, o que me aconteceu hoje. Tanto sabe que não há nada a dizer, que já engata outra frase antes mesmo que eu pudesse lembrar que fiz aquele doce.
Eu escuto a sua voz vindo com cheiro de banho, mas sem saber o que você está dizendo, vou refazendo os planos. O olhar de cumplicidade já vai me parecendo difícil, quem sabe o carteado ainda dá... Sua voz já está bem perto de mim quando vejo que você está vestido, com aquele terno, o mais bonito. Não acredito que você já vai sair. Mas você já viu essa minha cara outras vezes, e sabe que é só falar antes de mim pra eu não ter o que dizer depois de você. Dessa vez, o velho argumento, é preciso trabalhar, por comida em casa. Sorrio sem dentes, e penso na comida toda que vai pra geladeira.
E lá vai você, a caminho do nobre ofício. Eu, já vendo a marca de meus braços na base da janela, vou olhar você indo embora. Penso que talvez ainda não seja hoje o dia do recomeço. Sei que há um bar em cada esquina, e que você tem que comemorar. Sei lá o quê.
Você entra no bar, como eu já sei, e senta na cadeira branca com marca de cerveja no encosto. Fazendo aquele gesto que em nenhum outro lugar quer dizer alguma coisa, faz com que o garçom sirva algo bem gelado. E bebe. Será que, ali, enquanto sente o gole descendo pela garganta, pensa em mim? Pensa que sou sozinha? Que trabalhei para fazer e desfazer o almoço que você não teve fome de comer? Pensa que hoje já não dá mais, quem sabe amanhã? Pensa? Não, você não pensa em nada disso, porque alguém já sentou do seu lado, e estão conversando. O gol tão bonito que o craque fez no domingo, mas também o gol que o mesmo craque perdeu, e alongam-se mais no último assunto, porque a parte ruim dá mais pra falar.
Entre o time que subiu e o time que desceu para a tal da divisão, passou aquela saia que não passou sem ser notada, e bem anotado ficou o telefone no guardanapo fino, daqueles que não limpa nada, mas que serve tão bem para anotar o que não pode passar sem ser notado. E a saia bronzeada vai embora, levando o sorriso da paquera que desconheço, mas que sinto tão lancinante que desfaço o provérbio do maldito coração que não sente quando os olhos não estão vendo.
Quando sinto as primeiras picadas dos mosquitos em meus braços, percebo que está escurecendo, é hora de sair da janela. Não sinto raiva deles, dos mosquitos, eles me rememoram que posso sentir. Um quase sorriso vem pro meu rosto, é que pensei que se eu dissesse, você diria que faço drama, não há de ser tão ruim quanto eu faço parecer. Enquanto fecho a janela, quase escuto a sua voz cantando animado. O seu novo amigo sabe como ninguém aquele velho sambinha, você aperta o peito de tanta saudade enquanto canta o refrão choroso e eu choro sem lágrima enquanto a música ecoa.
No final da música, você olha o copo, tá quase seco. O gesto pra pedir mais já não tem o mesmo ânimo, é que você está começando a cansar. A fome que você disse não sentir aparece, e o desmente apertando com força o seu estômago. A comida está gelada agora, mas eu vou estar aqui para esquentar, é o que você pensa. Eu não vou, dessa vez eu não vou.
A vida que leva não o deixa feliz, mas ainda assim é essa que você vai levando, sem nada mudar. Você vai precisar falar muito antes de mim, sabe disso. E eu vou estar cansada, mas vou ouvir tudo, para no final dizer que não dá mais pra continuar. O quê, eu não sei, mas isso não dá pra continuar. E você entra, eu penso que digo oi, mas nao digo. Sem saber por que, olho de novo para as suas mãos sem presente. Elas estão tão sujas, mas o seu sorriso é ainda melhor que o da manhã, e apesar de você não falar nada, ele me diz: Amanhã, vai ser diferente, vai ser tudo novo.
Eu não falo nada, quem sabe assim você percebe como estou magoada, mas você faz o que eu mais temia. Deita no meu colo e chora. Diz que a nossa vida vai mudar, mas diz baixinho, pra que nada ali se lembre de sua promessa amanhã caso não seja verdade, nem eu.
Você parece cansado. Passo a mão no seu cabelo sujo e penso na noite triste que tive sem você falando enquanto toma banho. Eu penso que você deve estar com fome, e pergunto se você quer que eu esquente a sua comida. Ao ouvir o sim, digo que vá tomar um banho, e fique falando alto enquanto eu esquento o seu prato.
Lá vem sua voz de novo com aquele cheiro, eu não escuto o que você diz, mas preciso que você fique ali, falando. Eu não sei explicar, já disse mais de uma vez. Eu vejo sua foto na parede, tem nela aquele sorriso que é o meu presente, a minha surpresa. Beijo a foto enquanto não te beijo, e sei que amanhã eu vou te ter na hora certa pro carteado, com aquele olhar cúmplice, já sabendo o que eu vou dizer. Eu sei que vai.









Homenagem a um coração apaixonado


Homem, caucasiano, vinte e dois anos, estatura mediana, signo de libra, regido por Vênus e Marte, refinado gosto literário, aguçado senso critico, e uma unha prestes a cair no dedo indicador direito.
Acompanho sua saga há tempos. Por vezes com um certo interesse científico, outras com a ira de uma criança contrariada, e ainda outras com a benevolência dos amigos. Acho que seria desnecessário dizer que prefiro a última.
Tenho a missão de dizer-lhe, baseada na sua história conturbada, e abusando das frases de auto-ajuda que o amor é tolo e injusto.
Isso posto, peço licença as amigas, pois pretendo aqui homenageá-lo publicado essa semana um e-mail enviado por ele que toca o coração de qualquer pessoa que um dia já teve uma paixão:

A saga de uma paixão:
Como é possível? Como é que ela me manda uma mensagem daquelas? Não é justo. É desumano, arrasador. Oferecer aquilo a mim, sem eu ter condições plenas de acompanhar, de satisfazer aquela tentação. Como pode?
Aquele e-mail chegou assim de repente e me deu um susto! Não sabia nem o que sentir. Alegria e angústia ao mesmo tempo. No começo confesso que fiquei eufórico. Poxa, tudo que eu queria! Fui lá, vi tudo com alvoroço. Queria tudo, não deixar sobrar nada. Mas não dava, era muito, não dava pra mim. Só um pouco então? Mesmo assim. Eu já estava no limite depois da semana passada. Eu sei que ainda vão surgir novas chances. Ela é assim, sempre oferecendo novas oportunidades. É realmente sedutora. Se você passa por perto, ela pega você e não larga mais.
Fechei tudo e resisti. Senti-me até bem! Poxa, eu resisti! Eu posso me controlar. Isso é bom. Inteligência emocional é importante. Não dá pra ficar sempre atendendo aos nossos desejos, se não a gente se estrepa.
Mas mesmo assim o e-mail ainda está lá, na minha caixa. Ainda o abro pra ver que coisa linda é aquilo, aquele assunto delicioso informando a oferta dela: Lojas Americanas - Todos os livros com frete grátis para todo o Brasil
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segunda-feira, abril 03, 2006

Autobiografia sem Memória


Acho que comecei a pensar no tempo quando tive que amargar o peso do conectivo “E” na minha idade... Vinte E um, vinte E dois... Para mim, bem que poderia ser menos dramático se fosse o infame conectivo aditivo substituído por um alternativo. Vinte OU três, vinte OU quatro... Só assim poderíamos gozar da imunidade de alterar comportamentos. Para os compromissos, vinte, para um denguinho e irresponsabilidades três. Pode crer que seria a solução para a paz mundial.

Já arrastando este infame conectivo, um certo dia confessei a uma amiga, a quem não ouso apontar o indicador, que desejava escrever minha autobiografia, e que o faria desde já, antes que os anos embotassem a memória, antes que o peso dos anos futuros emprestassem um falso glamour aos meus tediosos dias atuais.

A amiga, a quem o indicador insiste em apontar, recebeu a “brilhante idéia”, com uma sacudidela de ombros e um sorrisinho de deboche desacreditando a minha resignada determinação em enfrentar a audacioso projeto e ainda arrebatou com uma sentença em tom de praga, bruxaria, vodu ou sei lá o quê. O ânimo de antes resultou em um gosto de carne crua de realidade, e no consecutivo abandono na primeira e previsível linha do “eu nasci”.

Agora, a meio caminho de completar vinte E (olha ele ai novamente!) cinco anos, (o que já é a metade de cinqüenta, veja lá!), e já amargando a caquetice de achar as coisas estáticas, previsíveis ou acabadas, dei-me por retomar os planos, digamos que um tanto que ousados, de escrever uma autobiografia sem memória, e explico, desta vez menos megalomaníaca em abrangência dos mínimos segundos, afinal nunca fui muito apreciadora dos elefantes, e muito mais afeita àquelas lembranças que de tão caras, tornam-se concretas a ponto de pendurarmos na parede das sensações eternas e não perseguir os rastros de um passado embaçado e sem gosto.

Dadas as devidas justificativas preâmbulares, e antes que mais ombros indeterminados sacudam-se pelo riso do meu ingênuo intento, alerto de antemão que só o faço justamente pelo medo de esquecer as cenas que de preciosas e singelas fazem parte desse filme de espectador solitário, medroso e arfante, que hoje, antes de dormir, recordou-se de como quando era criança sua mãe soprava-me os pés por ela descalçados só para agradar-me com o frescor, e depois punha-me na cama, desdobrava o lençol recém lavado e o sacudia sobre meu corpo semi adormecido o deixando pousar suave, flutuando sobre o ar perfumado de sono. E ela o fazia sorrindo, como se aqueles fossem os atos de encantamento mágico, uma, duas, três vezes... Até aquele lençol solto no ar se tornar as portas do meu sono infantil. E hoje, estou aqui, lutando com um sono com o qual não consigo negociar, sabendo que o que me faltam são as sopradelas nos meus pés descalços, e o lençol perfumado, o sorriso, a mágica e a porta, e uma, duas, três vezes e zaz!

Amiga e ombros alheios, é assim que vou começar um dia a minha autobiografia sem memória, com esse soprinho nos pés...

segunda-feira, março 27, 2006

Conversas Banais, Vidas Banais


Conversas Banais de Elevador.


Sexto andar.

Sacudidela no estômago, blin-blons e ela entrou.

Botão freneticamente apertado para informar a pressa inútil ao elevador. A porta finalmente abre no sexto andar, e distraído estava ele.

Entra com passos macios e se posiciona ao seu lado. Um cheiro de almíscar. Açucarado. Batom suave e olhos fixos na porta que acabou de se fechar.

Pretende o anonimato da memória sempre deserta. De soslaio mede o corpo ao seu lado.

Quinto andar.

Deseja um martelo e a força. Ensaia mentalmente alguma frase de efeito. Sempre almíscar e aqueles pés brancos moldurados pelas sandálias...

Quem sabe diga uma “boa tarde”. Não. Jamais.
- “Boa tarde”

Voz conhecida, e o “boa tarde” de sempre a lhe espetar.
- “Boa tarde. Fazia muito tempo que não lhe via. Está igualzinha”.
Soco direto de esquerda.

Quarto andar.

Nunca reparou nela realmente. Tom irônico eterno.
- “Três anos e você também me parece igual”

- “Está bonita, o que tem feito?”.

- “Uma coisa aqui, outra ali. Sabia que casei? Estou grávida. Dois meses. Acho que é um menino...”

Olhou ternamente sua barriga. Sentia um gosto de passado na boca. Amargo. Eterno. Finalmente viu seus olhos brilhantes de futuro e pisou no abismo do presente. Entreviu cheio de um remorso sádico o que havia deixado adormecido no universo paralelo das possibilidades. Segurou seu queixo. Perdeu-se nos pensamentos do beijo que daria...

Sentiu o tocar dos lábios dele antes que a tocasse. Distância de um suspiro. Suas curvas e seus “ais”.

Tão suave quanto lembrava, fechou os olhos como se dor sentisse e o beijou.

Terceiro...

Segundo...

Primeiro...

Térreo...

Nova sacudidela no estômago. Olhos abertos, dedos fechados e um adeus de “nunca mais”.