terça-feira, outubro 20, 2009

Row your boat...

Tem uma musiquinha até meio infantil americana que vivo cantarolando sem pensar muito sobre ela, mas de certa maneira ela diz uma verdade redentora...
"Row, row, row your boat
Gently down the stream
Merrily, merrily, merrily, merrily
Life is but a dream"

E lembrei dela outro dia quando me perguntaram se o Brincos morreu, faleceu, bateu as botas, partiu dessa para uma melhor, abotoou o paletó, entre outros eufemismos... E a resposta, não poupando os meus pulmões para repetir, é só uma: Não, não e não! Eu me recuso!

Poderia enumerar motivos, e ainda bem que os números são infinitos, para que uma tragédia dessas acontecesse, mas nada é desculpa suficientemente “arrumadinha” (para contrastar com as esfarrapadas como falta de tempo, a quantidade de pastas empilhadas na mesa, meus dois insistentes quilos sobrando e a novela das oito) que possa ser aceita de bom grado...

Enquanto vou tentando arrumar nas prateleiras da minha mente os problemas colecionáveis, fico dialogando com meus brincos, (e não com os meus botões, que são muito ranzinzas), contando do que os meus olhos podem ver, do que eu posso imaginar e tudo mais que saltita aqui e ali sem testemunha a não ser eles, meus fiéis brincos e batom.

Os posts, tenho que admitir, não acompanham as novidades reais e as caducas, as elucubrações, o triste e o contente, o bolo queimado no forno e o meu bilhete quase premiado da quina. Mas isso é outra história... Uma que os dedos as vezes esquecem de contar.

Sendo assim não vou permitir nem que se dê ideias escabrosas ao moribundo, nem que se puxe o gatilho! Ou mesmo que se diga que o derradeiro suspiro seria algo possível. Não sou a favor da eutanásia, e ainda pacifista convicta!

Então ele vive.
Because Life is but a Dream.

E fim de papo!

segunda-feira, agosto 24, 2009

Changing

O que veio primeiro?O ovo ou a galinha? A Foto ou a música para o post de hoje??? Bem... A foto... Definitivamente a foto que adorei! E a música, nem preciso comentar, né não?
Changes - Seu Jorge

Não vou lamentar, o que passou passou
Eu vou embora, meu tempo acabou
Tenho muita coisa para descobrir
Eu sinto muito, mas tenho que ir
Vou pro mundo porque nada mais me prende aqui
É o final do show
E não fique magoado porque vou partir
É só o jeito que eu sou
Changes lá vem meu trem
Vem meu trem
To saindo fora porque eu vou me dar bem
Changes lá vem meu trem
Vem meu trem
Sei que tá na hora e eu vou me dar bem
Sempre em frente, nunca pra trás
Não é por nada não mas vou me divertir
Enquanto a vida assim permitir
Só procurar fazer amigos do bem, se precisar ajudar também
E agora a liberdade e o horizonte
Só você não sacou
Nova York, Ipanema ou Hong Kong
É nessa aí que eu tô
Changes lá vem meu trem
Vem meu trem
Tô saindo fora porque eu sei que vou me dar bem
Changes lá vem meu trem
Vem meu trem
Sei que tá na hora e eu vou me dar bem
Sempre em frente, nunca pra trás
Livre eu me sinto, sublime
Gente mais gente
O mar e o céu azul
Changes lá vem meu trem
Vem meu trem
Tô saindo fora e eu sei que vou me dar bem
Changes lá vem meu trem
Vem meu trem
Tô saindo fora e eu sei que vou me dar bem
Sempre em frente, nunca pra trás
Sempre em frente, nunca pra trás

quinta-feira, julho 23, 2009

Oração


Não sou um homem dado às facilidades. Às crenças que abrandam as mentes.
Se acreditasse nas coisas inexplicáveis - e devo acreditar, mesmo sem saber como, assim são as coisas inexplicáveis - pediria que me ensinassem a não querer.
Ajuda-me a anoitecer e a amanhecer. A não estar sempre a um passo do precipício, em estado de paixão arrebatada pela queda inevitável.
Permita-me que o vento me sopre até o avesso, virando e revirando até que nada reste. Que eu possa assistir as idéias serem consumidas como combustível, as velas nesse altar de incoerências.
Pediria de mãos unidas suplicantes que me livrasse do gosto do fim, do travo. E que raios de condenação me abandona à fúria desse olhar de desapego com o qual ela me açoita? Livra-me da memória, do gosto, do desejo, e dessa imensidão que me apavora ao não estar atado.
Amém.

terça-feira, maio 26, 2009

O Ponto




Sentia-se tragado. Sem já sem forças de procurar resistência em outros pensamentos que não fossem aquela imagem do absurdo e da completa coerência, da pele ligeiramente arrepiada, e aquele ponto negro em um mar branco, pintado atrevido no seio esquerdo dela.
Equilibrava sua vida apenas sobre ele, um sinal apenas, e deixando-se mover pelo ritmo do respirar dela, abandonando-se suspenso em sonhos pairando no teto daquele apartamento.
Já nem lembrava exatamente a quanto tempo estava contemplando aquele ponto negro. O tempo não era exatamente algo que o preocupasse, na realidade o que mais impressionava era o quanto um simples ponto o absorvia de maneira arrebatada e ao mesmo tempo ausente. O quanto lhe contava a história de ninguém ou do mundo inteiro.
Quando ela calçou seus sapados pisando na contramão dos antigos passos ele soube que aquele igualmente tinha sido um ponto. Um final. E só pensava no negro sinal pontuando uma frase de despedida qualquer que ela não disse.
E se abandonasse esse ponto e pensasse em retas? Não passaria uma infinitude de pontos. Ainda poderia deslizar o dedo indicador sobre a sua pele absorto pelo ponto, o único que não termina, o único que lhe cabe.


Imagem:http://sirismm.si.edu/juley_b/J0014272_b.jpg

sexta-feira, maio 15, 2009

Palavras não Ditas



Tem coisas que merrecem ser bebidas em goles tão grandes, daqueles que até escorrem pelos cantos da boca. Recentemente descobri esse site chamado "I can read", e esse é (felizmente) um desses casos.

Muitos e muitos posts me chamam atenção, esse quis colocar aqui por dizer um punhado de palavras não ditas e que quem sabe façam sentido e diferença para várias pessoas...

terça-feira, maio 12, 2009

Instead

Para a minha amiga Lorena, como Pedido de Antecipação de Tutela.
(http://www.youtube.com/watch?v=gyR2WhZC0qg)
 

Instead

(Madeleine Peyroux)

Instead of feelin' bad, be glad you've got somewhere to go
Instead of feelin' sad, be happy you're not all alone
Instead of feelin' low, get high on everything that you love
Instead of wastin' time, feel good 'bout what you're dreamin' of.


Instead of tryin' to win something you never understood
Just play the game you know, eventually you'll love her good
It's silly to pretend that you have something you don't own
Just let her be your woman and you'll be her manÂ…

Instead of feelin' broke, buck up and get yourself in the black
Instead of losin' hope, touch up the things that feel out of whack
Instead of bein' old, be young because you know you are
Instead of feelin' cold, let sunshine into your heart.

Instead of acting crazy chasin' things that make you mad
Keep your heart ahead, it'll lead you back to what you have
With every step you're closer to the place you need to be
It's up to you to let her love you sweetlyÂ…

Instead of feelin' bad be glad you've got someone to love
Instead of feelin' sad, be happy there's a god above
Instead of feelin' low, remember you're never on your own
Instead of feelin sad, be happy that she's there at home
She's waitin' for you by the phone
So be glad that she is all your own!

Get happy
She's waitin' for you by the telephone.
So get back home!


sábado, abril 25, 2009

Com um T bem grande de...



Eu ando mesmo uma chata...
Uma chata amorfa.
Uma chata, amorfa e repetitiva.
Uma chata amorfa, repetitiva e enfadonha.
Enfadonha e repetitiva? Isso é redundante ora!
Então, continuando: Uma chata, amorfa, repetitiva, enfadonha e redundante.
Não, não. Cega. Ceguinha, ceguinha, que não vê uma coisinha interessante na frente do nariz!
Sendo assim, uma chata, amorfa, repetitiva, enfadonha, redundante e cega, que está achando tudo muito chato, inclusive essa falta de posts menos chatos do que esse aqui...
Acusar a TPM é muito chato também?
Fazer o quê?
Chato né?

quinta-feira, abril 16, 2009

Saudade Pendente




Outro dia estava lembrando como as coisas pareciam simples quando eu não entendia o conceito de complexidade.
Acho até que faz falta essa simplicidade pela ausência absurda de uma lógica que não pudesse ser atado por duas pontas de um pensamento sem muitas curvas.
E me pus a lembrar desse tempo e me bateu um saudosismo meio infantil de quando eu amarrava um barbante no fundo de uma latinha em uma ponta e entregava a outra latinha para alguém logo ali atrás da porta e conversava através do fio, achando muito mágico falar com alguém tão “longe”.

Bons tempos em que a distância estava ali na pontinha do barbante...
Estava aqui só pensando nessas “pontinhas” deste barbante invisível, atando umas vidas pendentes espalhadas por ai...

quinta-feira, março 26, 2009

Yes I am!!!

Yes, I am... And I love it!

sexta-feira, março 13, 2009

Need

Sintam-se plenamente livres para completar essa frase.
E se a resposta for o óbvio ululante, a sua existência provavelmente ainda tem solução...

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Rounding and rounding...



Perdão.
Cumprimentos em linguagem enigmática. Usuais.
Só penso “extraordinário, extraordinário” em uma lógica incoerente e cíclica, sem muito senso, querendo sentir um infinito que não me cabe cheio de umas miudezas colecionáveis, e sei que é essa a sua matéria. E novamente...
Perdão.
O sol ardente queimando lentamente e imagino-o sádico e carrasco. Talvez seja a gentileza. Colocaria todas as mesuras no liquidificador, junto com aquele aceno.
Perdão.
Mas me curvo. E bebo com as mesmas duas pedras de gelo de sempre. Girando com o dedo e apagando os incêndios com conta gotas.
Extraordinário mesmo, e ainda continua girando, é esquecer.

terça-feira, fevereiro 10, 2009

Amor Branco e Preto



A mão espalmada sobre a mesa. Cinco dedos retos esticados. E ainda lembrava dos telhados além das janelas e da estrela do mar que esqueceu enquanto mirava a faca entre os lances dos dedos. O propósito ou a falta dele lhe espetou mais uma vez. Faca ao invés dos pincéis.
A gota de sangue brotou rapidamente da pele lacerada, farta e intensamente vermelha. Uma intensidade que lhe faltava de alguma maneira que não sabia explicar. E sentia falta daquela cor, do vermelho dos seus lábios, ou do verde de uns olhos distantes espiando pelas frestas das janelas. Aquelas que estão abertas e que miram telhados e um céu cinza cheio de histórias caladas.
Levou o dedo à boca sentindo o gosto de ferrugem forte. Aquele gosto vivo, que arregala os sentidos e desperta o primitivo instinto de defesa. Mas já aprendeu a sangrar, é isso que dizem as cicatrizes.
Abraçava meu vazio e dizia que era um profundo mar azul para mergulhar. Antes adivinhasse marés.
Roubaram-lhe as cores ou nunca as teve. E essa tela pendurada na parede desbota um pouco mais a cada dia.
E só quis que pintasse esse amor branco e preto.

Imagem: http://ffffound.com/image/3227ec97d7d24016ab3c1d6ef0453efd576a1461

quinta-feira, janeiro 29, 2009

What if...



E se não tivesse começado pelo avesso?
Do fim ao começo.
E se agora não passasse de um nome qualquer,
E se não fosse a sombra dos meus pensamentos.
Seria hoje o que foi ontem e não o inverso.
Seria o dileto refúgio dos meus ideais.
E se não tivesse usado palavras em vão,
E se eu não pousasse minhas esperanças nesse galho frágil
Dos caminhos que nunca serão trilhados.

terça-feira, janeiro 20, 2009

As duas pontas


Não sei porque as pessoas dizem que "estão velhas". Como se isso fosse algum estado remediável. Reversível. Ou se é, ou não se é velho. Mesmo que as datas digam outra coisa, mesmo que esse seu sorrisinho dissimulado negue, sou velho. Esse é o pensamento construido pelos tijolos mais sólidos dessa minha construção.
Assim devo enfrentar algum início para esta narrativa se é o que me pede com esse ar irresistivelmente pedinte. E se os começos, que geralmente são novos, e eu diria tão vazio quanto qualquer possibilidade pode ser, ora que coisa tão óbvia, o meu será velho. Como eu.
E se me perco em encontrar finais, os inícios reluzem com bandeira de largada e tudo. O tiro inicial! O meu acho que começa no dia que entendi como começo aquele minuto e não o anterior, e não o que viria.
Aquele.
E isso seria uma noite que me peguei olhando fixamente minha capa de chuva e meus sapatos no canto da sala como se eles fossem às únicas coisas no mundo que me dissessem algo sobre mim. E talvez fosse verdade.
Igualmente lembro que nessa noite também sai da minha casa pela porta da frente e não dei duas voltas na fechadura. Ainda recordo que deixei o prato do jantar sobre a mesa esfriando lentamente. E que tive o cuidado de deixar o cigarro acomodado no cinzeiro sem que eu o acendesse. A minha mulher estava na cozinha cercando-se de afazeres indispensavelmente dispensáveis. Intermináveis. Eternos! Põe sal demais na sopa e esquece de açúcar no beijo. Péssima cozinheira isso eu digo sem medo que mal me julguem por ser injusto em relação a ela. Qualquer um diria o mesmo.Lembro da cor da toalha da mesa naquela noite, mas não lembro da cor dos olhos dela. Tão pouco lembro quando foi a última vez que me fitou. Que me viu ou apenas enxergou a capa de chuva invadindo porta adentro no horário habitual.
E chovia como não poderia deixar de ser.
Sempre chove em horas assim. Ou então deixamo-nos carregar por reminiscências enfeitadas por detalhes mais românticos. Só pode ser. Porque lembro que choveu no meu primeiro beijo, e chovia lá fora da janela quando senti o mundo dissolvendo pela primeira vez nos braços de uma mulher, e chovia quando senti as mãos geladas da minha mãe dizendo que eu fosse feliz, e chovia todas as infinitas vezes que eu lembro dessa minha alma caminhando pela vida, e talvez seja por isso que carrego sempre essa capa de chuva comigo.
E razões? Porquês? Poderia eu novamente me deixar ser carregado por uma imagem romântica qualquer e dizer que o já sabia desde daquele primeiro minuto do qual falei antes. Mas sabe, nunca se pensa exatamente nele, assim, dessa forma articulada e lógica, no primeiro passo. Ou no segundo. Nem sei bem se no último. Mas para não deixar ninguém desapontado, digo que comecei pelo fim, e essa foi a razão.
Deixei aquela casa cheia de intermináveis "meios" - vida pelo meio, amor pelo meio, ódio pelo meio, nem frio nem calor - decidido a entender o fim. Qualquer que fosse ele.
Não. Eu não pretendia me matar, se é isso que está pensando.
Quanta obviedade nisso! Chega a ofender!
Mesmo sabendo que alguns dizem ser este fim, a morte, e ainda outros dizendo que já se experimenta o fim quando se nasce, cada um com sua receita e eu sem mapa, sem ponto final. Só com uma capa de chuva e aqueles sapatos velhos.
Andei pela noite até que a escuridão que engolia meus passos fosse tão amistosa quanto a minha alma, e só parei com o reconhecimento do companheirismo solidário dos meus dedos doloridos dentro daqueles sapatos. Tive que admitir como real o sangue viscoso que me empapava as meias.
Calhou que esse minuto, e não o anterior, e não o que estava por vir, se deu em frente a um bar, seu eu quiser suavizar meu relato, mas nunca fui dado às firulas, então melhor que eu diga algo mais próximo ao real. Parei em frente a um puteiro de fachada rosa que ficava exatamente na esquina em que admiti que nunca se está só, porque a consciência da solidão já é acompanhante por deveras incomodo e tagarela!
O lugar era triste, ao inverso do que se possa pensar, já que a todas as coisas desejadas sempre se está associada exatamente o que se vende ali tão fácil, não em prateleiras, o que seria mais prático, mas desfilando decadentemente dentro de lingeries vermelhas puídas.
Sempre se imagina dança, gargalhadas pelo ar, um tanto quanto pueril da minha parte essa minha imagem, admito, mas não digo que foi algo que me decepcionou. Acho até que fiquei aliviado por me sentir tão "familiar" ao ar do lugar. Logo uma mulher corpulenta veio tentar sentar no meu colo, talvez se não estivesse tão bêbada o teria encontrado mais facilmente, mas vê-la tentar não escorregar pelas minhas pernas tornou-a mais humana, mas o que me agradou ainda mais foi poder enxergar seus olhos tão de perto, mergulhado dentro de suas enormes pupilas, que me encaravam oferecendo e escondendo ao mesmo tempo.
Bebi um trago. Dois. Não lembro. Matemática nessas horas é tão desnecessária, isso eu lhe digo! Necessário é lembrar do calor dela ao meu lado aproveitando-se da minha generosidade em pagar-lhe mais uns tantos goles quantos fossem necessários a mover-lhe no topor de manter-se em um movimento necessário qualquer. E ela não era do tipo que se diz "inesquecível", acho que longe disso. A especialidade dela talvez fosse a propriedade de ser ligeiramente esquecida. Fica o gozo, e deixa-se a imagem na soleira da porta. Nada mais apropriado.
Logo me desfiz dos sapatos e os dedos pararam de gotejar sangue como se sentindo libertos. E depois se foi o nó da gravata, o primeiro botão da camisa e o cinto da calça.
Não sei exatamente se passaram dias, semanas. Nunca fui muito atento aos calendários. Mas entendo que o tempo se passou não por contar os nascer do sol, ou as garrafas de vodka, mas pelo sorriso usual das putas. Do “bom dia caseiro” brindado com beijos na testa e afagos. Acho que virei bicho de estimação delas. Algo assim. Sem nome, origem marcadas por cicatrizes aqui e ali, nem dinheiro mais que as comprasse ou admiração que eu nutrisse, já que cheguei só um pedaço de gente e a inda não havia encontrado matéria para me reconstruir ou martelo que me despedaçasse por fim.
Acabei por habituar-me a dormir durante o dia e despertar com o frescor da noite. Coisa que qualquer cachorro de rua igualmente aprenderia rápido. E não digo que este foi o único dos meus truques. Para agradar as minhas adoráveis companheiras, agarrei-me a um caderno de desenho e uma caixa de lápis carvão esquecido por algum talentoso e apressado freqüentador, e dei a desenhar os retratos delas. E como riam das belezas que encontravam naqueles meus riscos... Das bocas, dos olhos, dos feitiços que talvez esquecessem que talvez tiveram algum dia. Ou ainda tivessem já que eu os via ali, no meio daquelas minhas formas incompletas. As imagens das imagens.
Impressiono-me ainda comigo mesmo, meio abismado por assim dizer, em como me deixei absorver exatamente por essas imagens. Rapidamente passei a tomar gosto e servir-me de modelo não as roliças coxas daquela da primeira noite, por exemplo, mas as pessoas que entravam ali, os homens, os ávidos homens. Os feridos daquela guerra lá fora, era isso que me pareciam. Soldados. E os beijos curativos, os gemidos os sons do conforto. E eles se permitiam. Ou me permitiam desenhá-los desse jeito sem escudo. Talvez por verem-me como igual. Só sei que via. E de olhos bem abertos as marcas das histórias. E de como com meia dúzia de verbos contavam do gênesis ao apocalipse das vidas de cada um. E eu a achar-me superior por ver tanto assim. E eu a achar-me diferente e completo uma vez que fosse. Até aquele dia...
E aquele dia e não o anterior, e não o que estava por vir entrou um jovem pela porta. Parecia apressado. Correndo em busca de suas próprias urgências, e eu, o velho e sábio cachorro de rua da casa, já reconhecia todos os tipos delas, das necessidades que entravam por aquela porta. E tinha um caderno idêntico ao meu, apenas mais novo. Novo e vazio. Assim como são os inícios. E depois de beber sua dose medicinal de esquecimento, sentou-se o jovem bem na minha frente com um ar curioso e deu a jogar-me “ossos”, dando-me mais meia dúzia de lápis e a olhar interessado os meus rabiscos, dizendo-se espantado com meu rústico talento.
Ele pegou seu caderno vazio e os lápis que carregava junto a braguilha esquecida aberta e pôs-se a conversar coisas que pareciam tão distantes, além mar, era como eu lia nas poesias quando menino. E sem que eu percebesse havia desenhado a minha imagem. E eu a olhava e não podia conceber. E eu fitava os olhos dos olhos da minha imagem e pensava que não me refletia. Ora que artista mais fajuto esse que me pinta como um moleque. Um moleque que se assusta com a imagem de si mesmo! E a algazarra ao nosso redor era muita, e aquela, a do primeiro dia, beijava a mim e ao jovem artista empolgada com a semelhança. O jovem estufava o peito satisfeito, e aos poucos fui pegando o papel e contornando com os dedos as linhas. E com a mão da memória acariciando o meu próprio rosto esquecido. Tão jovem quanto as linhas traçadas. Tão jovem da maneira como eu jamais pude me ver.
E foi assim pelos olhos daquele outro jovem que vi o início. E foi seguindo aquelas linhas que me postei no meio e soube entender a sua transitoriedade necessária. E dessa maneira soube reconhecer o fim.

terça-feira, janeiro 13, 2009

As tranças


O quarto já cheirava a sono.
Decorado com os sonhos de outros tempos pendurado nas paredes.
Ela sentada na beirada do colchão falava de qualquer coisa como vestido rosa, água e pão francês. E eu apenas perdido enquanto ela tecia as tranças dos seus cabelos. Será que ela sabia que junto tecia meu destino? Que aquelas eram as correntes das quais jamais me libertaria?
Irreversivelmente atado rezo para um Deus que não acredito, que me livre da consciência, que não me livre da cegueira absurda que cobre os meus olhos, que me livre de algum dia querer coisa alguma a não ser manter-me preso aos fios daquela vida sentada na beira da cama. Essa é sua prece descrente que recita silencioso enquanto ela passa a escova levemente no final de sua trança que lhe pende sobre os ombros e contorna seu seio esquerdo.
Aproxima-se dela, beija o seu rosto suavemente e lhe desfaz as tranças só para que ela lhe resmungue qualquer coisa malcriada e recomece seu lento tecido de destinos.

Imagem: http://www.skineart.com/
http://vdgraphic.blogspot.com/

quinta-feira, janeiro 08, 2009

Aquela pergunta


Ela mascava chicletes enquanto eu mascava palavras. Em nada diminuía o abismo aquele meu nervoso esfregar de mãos. Ao mesmo tempo que ansiava as fugas mais rápidas, procurava as saídas mais próximas, imaginava aproximar-me dos seus cabelos soltos e livres, brinquedo do vento, acenando como a convidar-me a tais ousadias.
Caminhando distraidamente pela areia, ela movia-se com o ritmo das ondas, passos cadenciados pelas palavras macias e redondas que via saindo quase que em nuvens da sua boca.
Escuto “ais” pelo caminho, mesmo sem querer ouvi-los. Imagino se são os que acumulei aprisionados, ou se a compreensão alheia que desdenhei e agora geme. São todos espinhos, isso que são. Faltaram-me acenos, afagos e tapas.
Nada importa enquanto sentir o calor das infinitas possibilidades que exala daquele corpo jovem. Ela sorri de espanto ou pelo puro vício... Por vezes corria em disparada, como em um galope frenético de um cavalo selvagem. Mas de mim não esquecia e logo voltava, gargalhando em círculos ao meu redor, e silenciosa cúmplice dos meus passos lentos e desses pensamento rasos punha-se ao meu lado.
E o que eu posso dizer do tempo? Tornou-me patético, cruel e tolo.