O texto rondava fazia um tempinho, mas agora ai está!
Creio que vai demorar um tantinho para uma próxima postagem por dois lindos motivos superiores que estão para chegar, mas hora ou outra estarei por aqui novamente...
De alguns fatos não há
como se esconder, por mais vergonhosos que sejam. Eu sempre quis saber cantar. Sem
muitas justificativas, ou longos discursos sobre expressão artística ou da alma. O máximo
que consegui foi a conveniência de uma mudez infame.
Para aumentar a
humilhação, com o tempo, adquiri técnicas para ocultar-me no acanhamento e apropriava-me
da voz alheia aprisionando-a na minha boca vazia enquanto a melodia ajudava o
embuste mudo do meu canto inexistente. Dublagem de voz e sentimentos. Nada mais
apropriado!
Acho que por isso odeio
tanto você, despindo-me da minha farsa perfeita, me fez imaginar palcos, e até imaginei
cantar no seu ouvido enquanto você ouvia e sorria. Imaginei que gostaria de
ver-me envolta em compassos, que amaria tudo o que escorreria dos meus refrãos,
não como verdades ou juras, mas como a imagem das possibilidades que nunca
realizaríamos. Como eu o odeio!
Não sei se para me
afrontar, você sim cantava e eu gostava de ouvir. E eu ficava intrigada
tentando encontrar explicação para perfeição. Os sons não saiam apenas dos
lábios, mas também daqueles olhos disfarçados de boca que confessavam, mas
nunca me diziam. Você cantava e eu emudecia.
Como parte da crueldade, amava vê-lo cantar, me tornando a mais miserável
das criaturas.
E eu, apenas me afogava
em palavras que nunca ganhariam pernas enquanto ele todo prazeres! Boca, peito,
palavras e juras! Gostaria de escrever as rimas de uma paixão certa e concreta,
cheias de detalhes e toques, cheios desse você que tanto detesto!
E muda deveria ter me mantido. Mas ao invés de me recolher
no canto escuro da minha raiva de vê-lo desenhando em acordes, agarro-me ao microfone
na certeza de que terei a voz e cantarei.
Mesmo assim, só me resta o silêncio!
---x---x---x
Já não se escrevem mais
cartas como antes. Tão pouco canções que brotem da caneta imaginária de um
poeta sofrido. Mas ela guarda letras embaixo do colchão. Esconde cartas
amarrotadas que nunca serão enviadas. Criatura de outro tempo
esta! Não pertence ao passado e assombra o presente. E se assim pode
ser dito, só se constrói inteira em um futuro que imagina em diversos
finais, montados e remontados, se deliciando com as possibilidades.
O calor dos holofotes
faziam suar a testa. Minúsculas gotículas brotando
pela pele. Disfarçadamente limpava o suor com as costas da mão
direita enquanto sorria angustiada, procurando a primeira saída, a fuga
perfeita. Mas encurralada que estava em seu próprio orgulho, balançava-se
sobre os próprios pés, dentro de seus saltos vermelhos de camurça.
Vestia-se de sua
personagem indefectível de si mesma e agarrava o microfone, se
deixando penetrar pela dor de um sentimento anunciado pelo primeiro
acorde que ressoava. Quem assistia este segundo entre
aqueles olhos fechados e a primeira nota, prendia a respiração em suspense
exultante, em espera atenta, quase em um estado de paixão.
E só assim, devorado, as
mãos inquietas, torcendo os dedos em infindável anseio pelo segundo
seguinte, tirano e consumista insaciável, porque o presente
nunca basta em si. Odiava a ousadia desafiadora, entregue a própria voz.
Embalada em notas e sonhos de outro tempo, cobre-me com poesia e desejos. Fecha os olhos
enquanto canta, mas se sente incapaz de o fazer enquanto beija. Engulo o ódio que me dedica, e o amor que me recusa, junto com as palavras e notas.
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